“O PT”, desabafou Lula da Silva à revista britânica The Economist, “está farto de pedir desculpas.” Talvez o tenha feito a portas fechadas, em absoluto sigilo, pois ninguém jamais viu um petista publicamente arrependido por ter participado de governos ineptos e corruptos. O PT, ao contrário, não se cansa de alardear a culpa alheia, mas os brasileiros se cansaram de esperar um mea culpa pelo mensalão, pelo petrolão ou pela recessão, que figuram com brilho entre os maiores casos de degradação moral e socioeconômica da República.
O PT jamais se desculpou por sua irresponsabilidade em relação a quase todos os principais temas políticos e econômicos do País. Por exemplo, veio de Lula da Silva, que hoje se apresenta como salvador da democracia, a ordem para que os constituintes petistas votassem contra a Constituição. Na lógica do quanto pior para o País, melhor para Lula, o PT bombardeou o Congresso com ineptos pedidos de impeachment contra Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso e sabotou do Plano Real à modernização da telefonia, passando pela criação das agências reguladoras e das regras de responsabilidade fiscal. No Planalto, perverteu o regime democrático distribuindo mesadas a deputados e capturando a estrutura do Estado para financiar sua máquina eleitoral.
Dos partidos de expressão, o PT é demonstravelmente o mais autocrático: ninguém duvida, a começar pelos petistas, que Lula manda e o partido obedece. Lula insulta a inteligência alheia ao tentar se desvencilhar da presidente Dilma Rousseff, como se a desastrosa política econômica de sua criatura já não existisse em potência no segundo mandato lulista. Três anos antes da primeira eleição de Dilma, por exemplo, Lula já preparava o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o pacote desenvolvimentista de injeção de anabolizantes na economia via bancos públicos que viria a se tornar uma das marcas do governo de sua sucessora. Comparada aos emergentes, a média do crescimento nas gestões petistas foi ainda mais medíocre que o já medíocre histórico nacional. A “aceleração do crescimento” ficou só no discurso, e o preço dessa patranha os brasileiros pagam até hoje.
Uma vez alijados do poder, os petistas correram o mundo desmoralizando o Estado de Direito brasileiro. A narrativa se mantém até hoje: Dilma Rousseff, por exemplo, foi vítima de um “golpe” do Congresso, e o Judiciário “perseguiu” Lula conspirando com as “elites”.
O PT não se desculpou pelo incentivo à cizânia política – o “nós” contra “eles” – que gestou o bolsonarismo, tampouco pelo apoio a ditaduras de esquerda latino-americanas, pela tolerância com o corporativismo e o patrimonialismo, pelas campanhas de desinformação e difamação de adversários. Lula não pediu desculpas nem sequer por ultrajes que – pelo benefício da dúvida – poderiam ser tributados à sua juventude, como quando, na flor dos seus 34 anos, expressou admiração por tiranos como Mao Tsé-tung, o aiatolá Khomeini e Hitler – que, nas palavras de Lula, “tinha aquilo que eu admiro num homem, o fogo de se propor a fazer alguma coisa e tentar fazer”.
Cansado da farsa, o povo foi tomado irresistivelmente pelo sentimento antipetista, consubstanciado nas multitudinárias passeatas pelo impeachment de Dilma, em 2016, e em 2018 e elegeu o antípoda Jair Bolsonaro – cujo grande feito, em razão de sua truculência e de seu calamitoso governo, foi ter feito uma parte significativa do eleitorado sentir saudades de Lula da Silva. Mas nada mudou: como mostra a entrevista do demiurgo de Garanhuns à Economist, não há razão para acreditar que Lula da Silva tenha a intenção de demonstrar contrição pelos inúmeros erros e desvios que ele e seus companheiros cometeram. Afinal, por que aquele que não se considera um ser humano, mas uma “ideia”, que não se cansa de dizer que é a “alma mais honesta” do País, que diz ter sido o “melhor presidente da história do Brasil”, que frequentemente se compara a ninguém menos que Jesus Cristo e que se oferece como a encarnação do próprio povo se desculparia pelo que quer que seja?
Publicado originalmente em O Estado de São Paulo