Porto Alegre, sexta, 29 de novembro de 2024
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Porto Alegre: Márcio Pinheiro autografa hoje 'O Que Não Tem Censura Nem Nunca Terá'. Chico Buarque completa 80 anos nesta quarta-feira; por Felipe Vieira

Detalhes Notícia

 

Márcio Pinheiro nasceu em 1967 – ano em que Chico Buarque lançou “Noite dos mascarados” e “Com açúcar, com afeto”. Apaixonado por música e conhecedor profundo da história da MPB e do Jazz, o jornalista desde 1989 analisa com maestria em seu mais novo livro, como as obras de Chico Buarque, permeadas por críticas sociais perspicazes e poesia engajada, despertaram a fúria dos censores e o colocaram na mira do regime durante a ditadura. O personagem é um dos maiores compositores da música popular brasileira, e um dos nomes mais perseguidos durante a ditadura militar e é sobre esse período que trata “O que não tem censura nem nunca terá – Chico Buarque a repressão artística durante a ditadura militar” (L&PM).

No Prefácio, o jornalista, escritor e tradutor Eric Nepomuceno, amigo e conhecedor da obra de Chico Buarque, trata do autor e obra: ” Já na abertura do livro O Que Não Tem Censura Nem Nunca Terá, verso roubado de uma das mais belas e definitivas canções do Chico Buarque, Márcio reconstrói com precisão a história da censura no século passado. Conheci o Chico pouco depois do golpe, e somos próximos até hoje.

O que este livro traz é a reconstrução, em detalhes, daqueles tempos de pesadelo, fúria e dor. Há minúcias que eu mesmo tinha esquecido.
O Chico não gosta de falar daquele tempo de breu. Mas, se por acaso ler este livro, certamente ficará espantado com a reconstrução feita pelo Márcio, que curiosamente – e, claro, pela idade – não padeceu aquele sufoco tão tenebroso. Para quem viveu aquele temporal, é trazer a memória de volta. E, para quem não viveu, é trazer uma revelação mais que necessária, para que nunca mais torne a acontecer.”

Márcio Pinheiro, jornalista, escritor, publisher do AmaJazz, marido da Cássia e pai da Lina.

Para o crítico musical Tárik de Souza, “A saga do compositor entre 1966 e 1987 está decantada em minúcias e densa pesquisa no livro “O que não tem censura nem nunca terá – Chico Buarque a repressão artística durante a ditadura militar” (L&PM), do jornalista gaúcho Márcio Pinheiro, autor entre outros do emblemático “Rato de Redação””.

Em um trecho, ao tratar do período de perseguição de artistas, o livro acaba sendo fundamental pois trata da história da censura da arte durante a ditadura militar.

“Durante anos, o Brasil viveu dentro de uma jaula do medo. […] O [período] mais recente pode ser resumido nas pouco mais de duas décadas que vão do começo de 1964 a meados de 1985 e que foi marcado por uma forte repressão.
Chico Buarque foi o maior símbolo desta perseguição cultural e política.
Quando a ditadura se declarou vitoriosa, ele não havia completado vinte anos. Quando o AI-5 foi decretado, Chico recém fizera 24 e era um veterano, com seu nome já inscrito na história da MPB […]. E já era visado pela Censura.
A partir de então, Chico não teve descanso. Foi perseguido, censurado, vetado, exilado, cortado e até, de forma temporária, calado. […]
Nunca alguém havia recebido uma marcação tão forte e injusta na cultura brasileira. Em determinado momento, […] três de cada quatro composições que ele produzia eram censuradas, tornando impossível a montagem de um repertório mínimo para um show ou um disco. Em última análise, Chico atravessou boa parte dos anos 70 proibido de criar.

O gênio censurado

A ditadura militar que governou o Brasil de 1964 a 1985 coincidiu com a fase inicial da carreira de Chico Buarque (1944-), um dos maiores compositores da história da música brasileira. Foi em 1966 que o jovem estudante de arquitetura lançou “A banda”, seu primeiro grande sucesso. Nesse mesmo ano, “Tamandaré”, outra composição sua, foi proibida pelo Serviço de Censura, por ofender o almirante Tamandaré, o patrono da Marinha. Era o primeiro encontro de Chico com a Censura – o primeiro de muitos.
No ano seguinte, seria a vez de Roda viva (peça de sua autoria dirigida por José Celso Martinez Corrêa) ser alvo dos censores. Em dezembro de 1968 era baixado o Ato Institucional no 5, que suspendia todas as garantias constitucionais e dava início aos “anos de chumbo”. A partir daí, os artistas brasileiros não teriam mais paz. Para Chico, veio o autoexílio na Itália, a atividade de correspondente informal do contracultural O Pasquim e a criação de músicas antológicas, sob o tacão da Censura.
Foram dezenas de composições; algumas proibidas de imediato, e outras – como “Apesar de você” (1970) – que passaram inicialmente despercebidas pelo radar dos censores (não muito versados em sutilezas). Chico, articulado e bem-humorado, defendia-se concedendo inúmeras entrevistas. Resultado: tornou-se a face mais expressiva da resistência democrática. Algumas de suas criações, como “Cálice” (cale-se?), com Gilberto Gil, se tornaram hinos de oposição ao regime militar. Talvez nenhum outro artista tenha sido tão sistematicamente perseguido como Chico. Isso durou até o álbum Francisco, lançado em 1987 – quando se preparava a Constituição Cidadã, que, promulgada em 1988, passou a garantir a liberdade de criação artística.
Este livro traz um relato da relação conflituosa entre um dos artistas mais geniais já produzido pelo Brasil e a Censura oficial do regime militar. Ao mesmo tempo, trata-se de um magistral resgate da perseguição e da repressão artística no mais recente período em que todas as liberdades foram suspensas em nosso país. Um deleite para fãs e não fãs; para os que viveram durante a repressão militar e para as novas gerações que pouco ou nada sabem sobre o que é viver e criar sob o autoritarismo.”

 

Nesta quarta-feira, 19 de junho, dia que marca os 80 anos de Chico Buarque, Márcio Pinheiro autografa sua obra a partir das 17h30, na Pocket Store Livraria( R. Félix da Cunha, 1167 – Moinhos de Vento, Porto Alegre). O conheço desde a década de 1980, quando cursamos a Famecos (PUC-RS), acompanhei depois da formatura, o trabalho dele em veículos como Zero Hora, Jornal da Tarde e Jornal do Brasil. Nos últimos anos tem se dedicado a colocar em livros, parte de tudo que leu, estudou, investigou e ouviu em conversas com outros grandes pesquisadores da cultura brasileira. Dono de uma memória privilegiada e texto primoroso, nos entrega mais uma obra histórica, do nível de ‘Rato de redação: Sig e a história do Pasquim’ (Matrix, 2022), que foi finalista do prêmio Jabuti, na minha opinião merecia vencer. Espero que esse ano leve o Troféu para casa, porque ele retrata além de Chico, o Brasil de uma época que não podemos esquecer para não ver repetida.

Daqui para frente, não se falará em Chico Buarque, sem se referir a obra de Márcio e usando versos do homenageado, no futuro em

“… Alguma cidade submersa,

Os escafandristas virão

Explorar sua casa

Seu quarto, suas coisas … ” e  encontrarão “O que não tem censura nem nunca terá – Chico Buarque a repressão artística durante a ditadura militar” e saberão muito do Brasil e de Chico.