O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, votou a favor da limitação do compartilhamento de dados financeiros da Unidade de Inteligência Financeira (UIF), do Banco Central, antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), e da Receita Federal com o Ministério Público. Na sessão desta quarta-feira (20), somente o presidente, que é relator do caso, proferiu seu voto. O julgamento será retomado amanhã (21) para a manifestação de mais dez ministros.
O STF começou a julgar se dados financeiros da UIF e da Receita Federal, órgãos de controle contra fraudes, podem ser enviados ao Ministério Público sem autorização judicial. As informações financeiras são usadas pelo MP e pela polícia para investigar casos de corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e movimentações financeiras de organizações criminosas.
Em seu voto o ministro disse que o MP só pode ter acesso a dados globais de supostos ilícitos, sem documentos que possam quebrar o sigilo das informações.
No entendimento de Toffoli, o MP não pode requisitar à UIF relatórios de inteligência financeira (RIFs) “por encomenda”, sem que nunca tenha recebido um alerta dos órgãos de controle e para verificar se “tem algo contra fulano”. Da mesma forma, a Receita não pode repassar extratos bancários e declarações de imposto de renda aos procuradores sem decisão judicial autorizando a quebra de sigilo fiscal.
“Não pode haver RIF por encomenda contra cidadãos sem qualquer investigação criminal pré-existente ou se não houve alerta anterior emitido de ofício [espontâneo] pela UIF, com fundamento na análise de informações de inteligência contida nas suas bases de dados”, afirmou.
PGR
Na manhã de hoje, o procurador-geral da República, Augusto Aras defendeu, em sustentação oral, o compartilhamento direto dos dados com o MPF, sem a necessidade de crivo judicial.
Aras afirmou que o procedimento é crucial no combate a crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo, sendo observado em 184 países do mundo, e que a restrição de tal comunicação direta pode ser prejudicial à reputação do Brasil na comunidade internacional.
“Corremos o grave risco de o Brasil vir a ser considerado tecnicamente um paraíso fiscal, mácula excessivamente nociva a um país que necessita retomar o curso do crescimento econômico e estabelecer o bem-estar social”, disse o PGR.
Por outro lado, o advogado e jurista Gustavo Badaró, que representa o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim) na condição de interessado na causa, defendeu maior restrição na disponibilização dos dados, de modo a resguardar a privacidade e a intimidade dos indivíduos. Para ele, por ser o órgão capaz de denunciar pessoas, o MP somente poderia ter acesso a tais informações sensíveis sob a supervisão de um juiz, o que impediria abusos, argumentou.
Entenda
Hoje, a praxe é que órgãos de controle como a Receita Federal e a Unidade de Inteligência Financeira (UIF) enviem ao Ministério Público Federal (MPF) relatórios sobre movimentações atípicas, que podem indicar atividade ilícita.
No caso concreto, os ministros julgam o recurso do MPF contra a anulação, pela segunda instância da Justiça, de uma condenação por sonegação fiscal do dono de um posto de gasolina em São Paulo. A investigação teve início em um relatório do Fisco repassado diretamente aos procuradores.
O Supremo já firmou que a decisão sobre o caso terá repercussão geral. Isso significa que ao final do julgamento será firmada uma tese a ser seguida por todos os tribunais do país em processos do tipo.
O advogado do posto de gasolina, alvo do processo no caso concreto, não se inscreveu para realizar sustentação oral.