Porto Alegre, domingo, 22 de setembro de 2024
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Incerteza sobre futuro da Buser na região sul preocupa empresas de transportes

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Ação movida por companhias de ônibus intermunicipais pretende barrar atuação do “Uber dos ônibus” Ainda sem data marcada, o julgamento de uma série de ações judiciais que tramitam no Tribunal Regional Federal da 4ª Região tem sido mais uma preocupação para empresários e trabalhadores do setor de transporte coletivo interurbano que integram a plataforma Buser – app conhecido no país como “Uber dos ônibus”. A ação é movida por companhias tradicionais das linhas intermunicipais e interestaduais, que hoje tentam barrar a atuação do aplicativo de fretamento colaborativo criado em 2017 e que atende mais de 2 milhões de usuários no Brasil.

Por meio do rateio dos custos do frete do ônibus, o valor individual de cada viagem chega a 60% abaixo do mercado tradicional. Jair Spazzini, proprietário da Spazzini Tur, destaca que hoje cerca de 60% do faturamento de sua empresa, fundada em 1992 na cidade de Erechim (RS), vem das operações realizadas por meio da Buser. “Antes da pandemia não tínhamos ociosidade em nossa frota. Dos nossos 15 ônibus, seis foram adquiridos em 2019 para atuar exclusivamente na plataforma com viagens diárias e boa lotação”, explica Jair. Ao adquirir veículos produzidos por outra empresa de Erechim, a fabricante de ônibus Comil, o investimento feito pelo empresário superou os R$ 6 milhões. “Estamos ansiosos pela retomada dos serviços a pleno vapor. A empresa possui 40 funcionários. Conseguimos chegar até aqui, mesmo em plena pandemia, sem demitir ninguém. Apostamos na volta da normalidade, mas uma decisão judicial que proíba o funcionamento da plataforma irá nos deixar em uma situação extremamente delicada e sem condições de manter nossos funcionários”, explica Spazzini.

A realidade da Spazzini, que até o momento conseguiu manter sua estrutura intacta, mesmo com um profundo abalo no faturamento, é um ponto fora da curva. O impacto da crise nas companhias de transportes foi profundo, como em todas as demais áreas, levando às demissões em massa e até mesmo ao fechamento de empresas. Um estudo apresentado em julho deste ano pelo IBGE sobre o impacto do novo coronavírus no setor demonstrou que 1,3 milhão de empresas encerraram as atividades, elevando a taxa de desemprego no país para 13,1%.

Uma das tantas empresas do setor que não conseguiu manter o quadro de funcionários foi a catarinense Lucretur, que dedicava a frota de 10 ônibus para atuação exclusiva com a Buser. “Por causa da pandemia, todo o segmento foi afetado e não consegui mais manter os funcionários. Agora, com a possibilidade de retomada, minha intenção é recomeçar e recontratar, mas há uma enorme sensação de insegurança, pois estamos sem a garantia de que teremos a oportunidade de seguir operando com a plataforma. Sem ela, não vejo condições de permanecer com a empresa aberta”, desabafou Luciano Fornasa que se viu sem condições de manter seu quadro de 24 motoristas, além de 4 profissionais ligados à administração da empresa e ao atendimento dos passageiros.

Para Marcelo Abritta, CEO da Buser, a atuação da empresa no sul do Brasil tem sido uma das mais atribuladas no país. “Enfrentamos desafios em praticamente todas as regiões, mas sempre ficou claro que nossa atuação atendia a todos os requisitos legais, inclusive superando inúmeros quesitos, como o de segurança dos veículos, se comparados aos mercado tradicional”, justificou. “O que vivemos agora é uma situação sui generis, onde parece haver uma barreira contra o progresso. Se você perguntar a qualquer empresa parceira da Buser se ela ajuda a fomentar o mercado de transporte e turismo de uma região, a resposta será sim. Esse pequeno empresário dirá que nós ajudamos ele a empregar mais pessoas, a renovar sua frota e consequentemente girar a economia.

Os passageiros que utilizam a plataforma elogiam a qualidade dos serviços e os valores praticados. A quem interessa barrar a Buser? Quem ganha com isso? Certamente não é a sociedade, nem a economia”, pondera Abritta. Pioneira no setor ao inaugurar a abertura de um mercado tradicionalmente dominado por grandes grupos com operações há décadas, a Buser não é a única startup que pode ser afetada pela decisão. Outras concorrentes, como 4Bus, também disputam uma fatia, além do aplicativo de caronas BlaBlaCar, prestes a entrar no ramo de ônibus. E até mesmo plataformas criadas por grandes grupos tradicionais do setor de transportes, como ÁguiaFlex e WeMobi, aguardam ansiosas por uma decisão que permita o funcionamento das plataformas.

Batalhas judiciais

O TRF4 não é o primeiro campo em que a Buser e empresas de ônibus tradicionais travam uma batalha. Em diversas outras regiões, a Justiça vem se manifestando de forma favorável à atuação da plataforma. Em São Paulo, por exemplo, o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado de São Paulo (SETPESP) entrou com ação para impedir o transporte por fretamento colaborativo mediado no aplicativo. A Justiça Estadual, entretanto, decidiu que a empresa poderia manter os serviços. A disputa chegou até ao Supremo Tribunal Federal (STF), onde a Associação Brasileiras das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros (Abrati) ingressou com ação. Na ocasião, o ministro Edson Fachin não acatou a liminar pedida pela entidade, e a Procuradoria Geral da República (PGR) defendeu a extinção do processo, o que fez com que ele sequer fosse apreciado pelo tribunal.