Porto Alegre, segunda, 25 de novembro de 2024
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Vasco Vasconcellos: Poder feito à mão; por Leda Rosa/revista Voto

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No exclusivo e sofisticado mundo dos alfaiates, “excelência” é a palavra de ordem para atender a clientes exigentes e entregar muito mais do que roupas feitas sob medida. Foto: Acervo pessoal

 

 

O número 847 da Alameda Gabriel Monteiro da Silva, nos Jardins, área nobre da capital paulista, não tem placa indicando que ali funciona um dos ateliês mais concorridos do País: a Vasco Vasconcellos Alfaiataria. A falta de letreiro denuncia tanto o sucesso do negócio, que virou grife preferida por muitos homens poderosos, como indica que o segmento da alfaiataria se mantém discreto, mas firme diante dos solavancos sanitários e econômicos do País.

Vasco e os sócios Carla, Sérgio e Guillermo.

“Temos hoje um resgate do vestir bem, tanto que 90% dos nossos clientes são filhos que acabaram trazendo seus pais. É o contrário do que acontecia antigamente. São pessoas que acompanham as grandes marcas nas redes sociais”, diz Vasco, gaúcho do Alegrete, cujo rol de clientes inclui nomes como os empresários Abílio Diniz e Guilherme Peirão Leal, o apresentador Faustão, o Jurista Nelson Jobim, os Advogados Nelson Wilians e Rodrigo Tannuri, o empresário Alberto Saraiva, o historiador Leandro Karnal, e o amigo Victor Oliva, entre centenas de advogados, médicos, políticos e CEOs de grandes corporações. Com orgulho gosta de lembrar de clientes gaúchos, que conheceu há 30 anos, caso por exemplo do hoje bem sucedido advogado Cesar Peres que está montando escritório em São Paulo, “O conheci comprando roupas para a formatura. O ensinei a fazer o nó da gravata e de lá para cá nunca perdemos contato.”. O segredo para atrair e manter um time tão seleto de compradores pode ser resumido em três qualidades: excelência, encantamento e entrega!

Al Pacino em ” The Godfather “

Para quem não conhece a qualidade do trabalho de Vasco, basta saber que sua empresa é a única do Brasil autorizada pela alfaiataria Scabal, uma das mais prestigiadas do mundo, espécie de Ferrari da moda masculina. Localizada na Savile Row, rua de Londres que concentra a nata das marcas internacionais que trabalham sob medida, a Scabal é o nome nas etiquetas dos ternos da realeza britânica e de alguns dos homens mais poderosos e famosos, como Donald Trump, Barack Obama, Will Smith, Michael Jordan, Arnold Schwarzenegger, Tom Cruise, Robert De Niro e Paul McCartney . No cinema, a Scabal também assina, entre outros, os figurinos de Marlon Brando e Al Pacino na trilogia Poderoso Chefão, Leonardo Di Caprio em O Aviador e Titanic, O Lobo de Wall Street e de todos os James Bond.

Nelson Wilians

“Sempre tive vontade e fome”, diz Vasco, sorrindo ao recordar a infância, aos 4 anos de idade, caminhando ao lado da mãe, que vendia Avon de porta em porta. Com dona Darci, ele aprendeu a importância do relacionamento com os clientes e do trabalho, que começou aos 14 anos, como vendedor nas lojas de aviamentos De Ré, emprego disputado por boa parte dos filhos das famílias pobres em Alegrete. “Ganhei a vaga porque sabia o que era uma grosa, que havia aprendido com a minha mãe”, lembra referindo-se à medida que caiu em desuso e que indicava doze dúzias.

Ao longo da vida, Vasco tem seguido o que aprendeu com os pais. O seu Dirson, guarda noturno da Prefeitura e conhecido até hoje na cidade como Seu Toco, o fez perceber o valor do capricho no trabalho. “Um dia, caminhando ao lado dele na praça central, ele cumprimentou um jardineiro e depois me disse que não devemos medir um homem pelo que ele faz e sim por como o faz. Não interessa o que você faça, faça com o coração”, lembra, com a voz emocionada.

 

César Peres, cliente há 30 anos

Em Porto Alegre, para onde se mudou com 19 anos para atuar como vendedor, fazia todos os cursos de vendas que podia e trabalhava em uma loja de eletroeletrônicos de um shopping. Um dia, sua sorte mudou. “Apareceu um cliente na loja querendo detalhes de uma filmadora. Nenhum dos vendedores mais experientes quis atender, achando que ele não ia comprar. Eu atendi, expliquei tudo para ele porque tinha feito o curso sobre a filmadora e ele gostou de mim. Além de comprar a filmadora, me convidou para trabalhar com ele, na loja da Brooksfield no mesmo shopping.”

 

 

 

 

Vasco e Alberto Saraiva

Daí em diante, a moda masculina entrou definitivamente na vida profissional de Vasco, em uma trajetória de sucesso como vendedor e gestor de lojas em Porto Alegre, no Rio de Janeiro, Brasília e, depois, em São Paulo. Seu currículo inclui, além da Brooksfield, onde trabalhou por 16 anos, Ermenegildo Zegna e Camargo Alfaiataria. “Uma vez li que cada um de nós é uma empresa e isso me acompanha até hoje, temos que melhorar nosso trabalho a cada dia”, diz ele, que ao longo da vida fez questão de conhecer bem seu cliente para oferecer o que ele precisava. “Não é vender, é atender bem e entregar o que a pessoa precisa, superar a expectativa. Venda é resultado.”

Na prática, deu certo com ele. Ótimo contador de histórias, Vasco lembra que há alguns anos, assumiu a loja de uma grande grife, que havia caído da segunda para a quarta posição no ranking da rede. Depois de observar que os vendedores não estavam oferecendo ao cliente tudo o que ele precisava e podia pagar, ele entrou em ação, mostrando o desafio ao time das vendas e se apresentando a todos os consumidores que cruzavam a porta da loja (atendimento ao cliente, a lição de dona Darci). No primeiro mês, a loja retomou a vice-liderança. Em dois meses, era a primeira em vendas.

Vasco fez cursos na Sicilia e Puglia

Com um terno sob medida variando de R$ 7 mil a R$ 12 mil, Vasco fez cursos de alfaiataria na Sicília e Puglia, na Itália, de lá trouxe técnicos para capacitar os artesãos do ateliê, reforçando o que chama de “cultura do aprendizado”, prática que começa com ele mesmo, consumidor voraz de biografias, cursos e publicações sobre gestão e cases de sucesso nos negócios e alcança os 35 colaboradores, alguns dos quais começaram na faxina e, com um bom trabalho (fazer com o coração, como diz seu Toco), ganharam o direito a capacitações que os qualificaram para atuar na costura.

Parado pela pandemia?

Tamanho empenho não poupou Vasco dos danos trazidos pelas medidas de isolamento social impostas pela pandemia de coronavírus. Com a maioria dos funcionários com mais de 50 anos, ele fechou o ateliê em meados de março e perto do final de maio, a situação financeira era preocupante. De mãos atadas, não sabia que justamente a pandemia e os cuidados com os seus colaboradores mudariam a situação.

Carla criou uma linha exclusiva

“Não conseguimos ficar parados e começamos a confeccionar máscaras para os nossos colaboradores, seus familiares e para nossos clientes, mais de 15 mil máscaras foram distribuídas gratuitamente. Criamos um whatsapp e começamos a divulgação pelo Instagram nas contas @vascovasconcellostailor e @vascovasconcellosalfaiataria e os pedidos começaram a vir, os clientes e amigos voltaram a encomendar os ternos e as camisas sob medida pelo telefone, nos apoiando a continuar.

Como temos as medidas de todos os clientes, foi só mandar as máquinas para as casas dos colaboradores e retomar. Em junho, já havíamos recuperado os 50 dias parados”, lembra, ao lado da mulher e também sócia na empresa, a gaúcha Carla Vasconcellos. Os dois se conheceram no trabalho – Carla, era vendedoras da Brooksfield – e 21 anos depois, eles têm dois filhos, Pedro Arthur, de 17 anos e Carlos Eduardo, de 16.

Além de administrar a Vasco Vasconcellos Alfaiataria,  Carla atende uma enorme demanda por alfaiataria sob medida e resolveu levar experiência para o universo feminino. Vasco tem outros dois sócios, Guillermo Tizon e Sérgio Luizetto que juntos dão um show de excelência em atendimento, cuidando pessoalmente de todos os clientes. “Nosso sonho é ter a maior e melhor alfaiataria artesanal da América Latina”, confessa, abraçando Carla. Quem duvida?

 

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