Madrugada, 1h50. O médico intensivista chega apressado para mais um extenuante
plantão de 12 horas no CTI COVID do Hospital Moinhos de Vento. Mais um turno intenso, com
vários pacientes internados, alguns em estado grave e ventilação mecânica. A rotina do cuidado
dos enfermos se mescla ao protocolo: higiene das mãos, colocação do avental de isolamento,
propés, touca, luvas, máscara N95, face shield e aplicação de doses abundantes de álcool em gel.
E assim será no próximo dia novamente.
Rotina que se sucede de forma quase automática e sincronizada para os profissionais da
área intensiva. Dias e noites longas batalhando pelos melhores desfechos para os acometidos
desta pandemia sem precedentes. Um teste para todos os envolvidos nessa cadeia e, também,
para as estratégias de gestão dos hospitais — e alguns deles, infelizmente, não têm a realidade
mais adequada na pior crise de saúde de nossa história.
E diante de circunstâncias tão desafiadoras, um novo herói, discreto e anônimo se soma
aos médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem na luta pela vida: os gestores de
suprimentos. Nunca “o produto certo, no local certo a um preço justo”, foi tão valorizado pelas
instituições, na aquisição de equipamentos de proteção individual e outros insumos. Quem se
destacou na elaboração e execução de estratégias ajustadas para este momento de quase caos
está sobrevivendo à tempestade.
A rotina de gestão deste “novo normal” em supply chain no meio da crise tem sido
desafiadora para as equipes de suprimentos. Ações coordenadas entre as mais diversas áreas,
estabelecimento de comitês de enfrentamento à crise e rotinas diárias de reuniões, similares aos
modelos de S&Op da indústria, são o segredo do sucesso desde o início da COVID-19.
Velocidade na tomada de decisões, tempo de reação acelerado para mudar conceitos de
coberturas de estoques, adoção de novas padronizações, alternância de compras de itens
importados para itens nacionais e vice-versa. Essas são algumas das receitas para o trabalho
intenso desses profissionais.
E os desafios se tornaram ainda maiores com a intensificação da pandemia. Pelo país, o
colapso atingiu muitas instituições, exigindo grandes esforços não apenas das equipes
assistenciais, mas também da gestão de suprimentos. O consumo de EPIs, oxigênio e até mesmo
de medicamentos para intubação atingiu níveis nunca antes vistos. Vemos casos de instituições
utilizando, em poucos dias, insumos que durariam meses em dias normais.
Ainda temos um difícil caminho de erradicação da doença, que somente será
completamente concluído com a chegada das vacinas em escala e uma imunização em massa da
população, além de uma maior adesão às medidas de prevenção. É preciso ampliar a
conscientização dos brasileiros não apenas sobre a importância de se proteger, mas também de
se engajar na vacinação — que também carece de maior velocidade e mais vacinas.
Mas o pensamento tem de ser positivo e na busca pela retomada. O legado de
aprendizado e sofrimento com essa pandemia precisa ser assimilado e absorvido por todos.
Estratégias colaborativas de compras, reforço das redes de fornecimento, aplicação de
tecnologias e inovações, desenvolvimento de novos mercados fornecedores e fortalecimento da
indústria nacional, são vetores fundamentais de transição para este “novo normal” em
suprimentos que tanto desejamos. Aqui também, um caminho imprescindível e sem volta.
*Evandro Moraes, Superintendente Administrativo e Infraestrutura do Hospital Moinhos de Vento