A atual crise hídrica preocupa órgãos de monitoramento que, pela primeira vez na história, emitiram alerta de emergência para junho a setembro, dada a escassez de chuvas na Bacia do Paraná — que abrange os estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná. A situação é preocupante, pois essa região detém 70% da capacidade nacional de armazenamento de água para geração de energia elétrica.
Se engana quem pensa que o Rio Grande do Sul ficará fora dessa crise. Pode parecer irônico, mas o estado tem um importante papel para contribuir com energia limpa e barata para a matriz elétrica brasileira. Essa posição de destaque é fruto da tradição em planejamento e elaboração dos Atlas para recursos energéticos.
Ainda em 2002, conduzi o trabalho de medição do potencial disponível para implantação dos grandes projetos eólicos no RS. Esse estudo viabilizou mais de R$ 10 bilhões em investimentos entre 2002 e 2020 em 81 usinas – como as de Osório, Santa Vitória do Palmar e Santana do Livramento – além da geração de 150 mil empregos diretos no setor e da consolidação dessa importante fonte na matriz brasileira. Hoje, poderiam ser beneficiados mais de 13 milhões de habitantes. Ou seja, mais do que a própria população gaúcha.
Mas, no Brasil, crise hídrica significa crise elétrica. Isso porque as hidrelétricas — opções baratas e renováveis — concentram 60% da matriz. Entretanto, a estiagem compromete esse fornecimento. O governo federal já estuda estratégias de racionamento para evitar um apagão, e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) planeja um aumento de até 60% na bandeira vermelha nas contas de luz. É a tal “dor no bolso”, como forma de desestimular o consumo de energia elétrica.
Durante a pandemia, as energias eólica e solar atingiram recorde de capacidade no mundo e no Brasil. Diante da crise hídrica, essas fontes também são alternativas para garantir um fornecimento de baixo custo e limpo. Acionar as termelétricas significaria repassar os custos ao consumidor, sem falar dos impactos ambientais associados.
A atual crise hídrica pode sobrecarregar o orçamento das famílias, afetar a retomada da economia e aumentar ainda mais as incertezas de potenciais investidores do setor. Como o Rio Grande do Sul tem feito, é necessário continuar diversificando a matriz, atraindo investimentos em lugares com potencial – como Pelotas, Rio Grande, Tapes, São Lourenço do Sul – e garantindo o aumento da geração de energia com sustentabilidade.
*Co-autor do Atlas Eólico do RS e presidente estadual do Avante