Porto Alegre, sexta, 29 de novembro de 2024
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Blogueiro negou-se a responder às perguntas dos parlamentares da CPMI

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© Reuters/Adriano Machado/Direitos Reservados

 

 

Sem firmar compromisso de dizer a verdade, o blogueiro Wellington Macedo de Souza, recentemente preso no Paraguai e já condenado a seis anos de prisão por participar do atentado a bomba próximo ao aeroporto internacional de Brasília, negou-se a responder às perguntas dos parlamentares. Ouvido nesta quinta-feira (21) pela CPMI do 8 de Janeiro, o extremista disse que colaboraria se seus advogados tivessem “acesso às acusações”. Para a relatora, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), e parlamentares da base governista, as mensagens que fazem parte da denúncia efetuada pela Procuradoria Geral da República (PGR) indicam que o acampamento de bolsonaristas em frente ao Quartel General do Exército (QG), em Brasília, era um espaço de planejamento de atos terroristas. Já os parlamentares de oposição classificaram o depoimento de “perda de tempo” e reforçaram o pedido para ouvir pessoas relacionadas a possíveis omissões no âmbito do governo federal na proteção ao Planalto no dia dos ataques aos Poderes da República.

Wellington Macedo de Souza, condenado a 6 anos de prisão por participação no ataque a bomba na véspera de Natal, junto ao aeroporto internacional de Brasília: silêncio na CMPI do 8 de Janeiro
Geraldo Magela/Agência Senado

Em mensagens exibidas por Eliziane Gama, conversas entre Wellington Macedo de Souza e George Washington de Oliveira Sousa, também condenado à prisão pela tentativa de atentado a bomba na véspera do Natal de 2022, havia pedidos e orientações para que Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores (CACs) fossem treinados e acionados para as manifestações golpistas. Ainda na avaliação da relatora, os atos que ocorreram em dezembro de 2022, como a tentativa de invasão ao hotel, em Brasília, onde o então presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, estava hospedado (5/12); o ataque à sede da Polícia Federal (12/12) e a tentativa de explodir um caminhão-tanque junto ao aeroporto Juscelino Kubistchek (24/12), foram todos gestados e planejados dentro do acampamento junto ao QG do Exército, em Brasília.

— Lá estavam um acampamento montado com armas, munição de grosso calibre e também com esse tipo de discussão — observou a senadora.

Jornalista, Wellington Macedo de Souza estava foragido havia mais de três meses e foi preso no último dia 14 pela Polícia Nacional do Paraguai, em uma ação que contou com a colaboração da Polícia Federal (PF). De fevereiro a outubro de 2019, Wellington Macedo de Souza foi assessor da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, no governo Bolsonaro. Depois, passou a atuar como blogueiro. Chegou a candidatar-se a vereador em Sobral (CE) em 2020, mas não conseguiu eleger-se.

Segundo a denúncia da PGR, Wellington Macedo dirigiu o carro que transportou a bomba fabricada por George Washington para Alan Diego, que a instalou no caminhão de combustível no dia 24 de dezembro.

Atos embrionários
Ainda de acordo com o material apresentado pela relatora, desde 2021, dois anos antes do ato do 8 de janeiro, Wellington já fazia anúncios e convocações para promover a invasão do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Congresso Nacional. Ela citou, especificamente, um chamamento na véspera do dia 7 de setembro, do mesmo ano.

Segundo a denúncia da PGR, os extremistas convocaram a população por meio de redes sociais a praticar atos criminosos, que deveriam ocorrer durante uma manifestação e greve de caminhoneiros. Na convocação, viria a seguinte mensagem golpista: “Todos os brasileiros, sem exceção, devem ir à Brasília para fazer um acampamento e exigir a exoneração dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal e o julgamento pelo Superior Tribunal Militar contra os crimes que cometeram”.

— Parece que lá atrás, no 7 de setembro, já era uma ação embrionária [para o 8 de janeiro]. Já se pensava então a seguir com esse intento para se depredar claramente os prédios da Praça dos Três Poderes — ressaltou Eliziane.

Os senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Soraya Thronicke (União-MS), apontaram que o depoente deixou rastro em suas próprias redes sociais de toda a articulação para a incitação, planejamento e financiamento dos atos que ocorreram em dezembro e, por fim, os ataques do 8 de janeiro.

Omissão
Já os representantes da oposição afirmaram que as ações de Wellington Macedo, como a tentativa de atentado à bomba, não têm qualquer relação com os atos do dia 8 de janeiro. Na opinião deles, o depoente só foi convocado por ter criticado publicamente as decisões do STF. Os parlamentares oposicionistas também afirmaram que a CPMI não está se debruçando na investigação sobre as possíveis omissões envolvendo o governo federal.

— Está muito claro aqui no plano de trabalho que um dos itens aqui a ser investigado seria a omissão, o que é tão grave quanto as ações. As ações, nós já falamos aqui, eu acho que é unanimidade que ninguém está passando a mão na cabeça de ninguém. Quem fez tem que pagar individualmente. Agora quem se omitiu aí também deveria ter sido responsabilizado — afirmou o senador Izalci Lucas (PSDB-DF).

O senador Eduardo Girão (Novo-CE) foi na mesma linha.

—  Por que que o governo Lula não protegeu o nosso patrimônio? Nós tivemos pessoas sentadas onde o senhor Wellington Macedo está aqui, generais dizendo que bastavam ali mais uns cem, cento e cinquenta homens, que protegiam, que não entrava ninguém. Só a Força de Segurança Nacional, tinha mais de 250, fora os pelotões especiais lá do Palácio do Planalto, que o general do Lula não acionou, inclusive falseou documento público, adulterou. Por que que esse homem tá solto ainda, com todo o respeito à pessoa? — disse Girão, referindo-se ao general GDias, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, exonerado pelo governo.

Delação premiada
Com a insistência do depoente em não responder as perguntas e entendendo que Wellington não agiu sozinho, Eliziane chegou a oferecer o benefício da delação premiada. Corroborado pelo Ministério Público (MP), o instrumento pode ser uma opção jurídica enquanto meio de obtenção de prova.

O advogado de Wellington Macedo, Síldilon Maia Thomaz do Nascimento, que o acompanhava durante a oitiva, informou que a defesa não tem nenhuma restrição ou limitação para discutir o assunto com a Advocacia do Senado. No entanto, pediu um prazo até semana que vem para esperar uma decisão do STF. Segundo ele, foram apresentadas ações no âmbito da Corte pedindo acesso aos autos do processo.

Condenado
Após a conclusão dos levantamentos feitos por Eliziane, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) contestou a justificativa do depoente em não responder as perguntas por falta de acesso aos autos. Ela explicou que no caso da tentativa de atentado à bomba, ele já foi sentenciado e por isso todas as informações sobre o processo são públicas.

— O depoente fala o tempo todo que não teve acesso aos inquéritos. Particularmente, o inquérito da bomba do aeroporto, ele já foi sentenciado. Portanto, isso é público. Todos têm acesso. Como é que o advogado dele e ele não tiveram acesso? Então neste caso, se ele tem de fato essa condição para colaborar, neste caso ele teria que colaborar.

Já o deputado Marcos Feliciano (PL-SP) disse que as ações de Wellington não possui qualquer relação com os atos do dia 8 de janeiro. Na opinião dele, o depoente só foi convocado por ter criticado publicamente as decisões do STF.

— O senhor estava no meio daquela balbúrdia do dia 8 de janeiro aqui? O senhor participou desses atos de vandalismo? Acredito que suas respostas seriam todas ‘não’. Pois bem, então o senhor está aqui apenas por dois motivos, na verdade: o senhor criticou acidamente o STF. E, no nosso país, você pode criticar qualquer um: critica-se pastor, critica-se presidente da República; pode-se criticar o presidente aqui da CPMI; pode-se criticar qualquer deputado ou senador; mas não se pode criticar nenhum membro da Alta Corte, da Suprema Corte do nosso país, porque, infelizmente, eles são como se fosse uma casta superior, extremamente maior, exatamente porque há no nosso país um desequilíbrio dos Poderes — declarou Feliciano.

Randolfe Rodrigues contestou o deputado, ressaltando que Wellington, por enquanto já condenado por tentativa de explodir artefato, ainda deverá ser punido com cerca de 30 anos de prisão, não por atacar a Corte, mas sim por ter planejado e atuado para cometer um atentado terrorista que poderia ter causado uma tragédia no aeroporto de Brasília.

— O senhor não está aqui porque agrediu o Supremo Tribunal Federal; não é por isso que o senhor está aqui, não. O senhor está aqui porque o senhor tentou matar gente. O senhor está aqui porque o senhor tentou perpetrar um ato terrorista que levaria milhares de compatriotas seus — eu acho muito interessante como, nos vídeos, o senhor chama de patriotas —, o senhor iria levar inocentes compatriotas seus à morte — afirmou Randolfe.

Assessoria
Os governistas destacaram que Wellington Macedo ficou conhecido por divulgar denúncias falsas na internet e que já resultaram em dezenas de processos de reparação por danos morais, principalmente na cidade de Sobral, no Ceará. Eles também citaram que o depoente foi assessor da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, durante a gestão da ex-ministra e hoje senadora Damares Alves (Republicanos-DF).

Mas a senadora chamou de injusta a tentativa de ligar Wellington Macedo ao seu nome. Damares reconheceu que Wellington Macedo trabalhou na secretaria, mas disse que ele teria sido indicado a partir do reconhecimento pelo seu trabalho de denúncia contra a exploração sexual de crianças e adolescentes, exposto na CPI dos Maus Tratos, que funcionou no Senado, e por sua atuação no governo de transição, no final de 2018, após a eleição de Jair Bolsonaro para a Presidência da República.

— A secretária que estava sendo indicada para ser Secretária da Criança, viu o trabalho dele, [e ] precisaria de um assessor de comunicação e ele fazia vídeos incríveis, fazia muita coisa. Ele foi convidado para ser assessor na Secretaria de Comunicação e ficou de 8 de fevereiro a 18 de outubro. Ele teve problemas com o secretário lá na secretaria. E aí eu precisava deixar isso muito claro, porque esse vídeo que ele expõe uma cena de abuso sexual é lá em 2021. Se isso tivesse sido acontecido antes, ele não teria sido nomeado. Ele era um jornalista defensor da infância — declarou Damares Alves.

Descumprimento de Preceito Fundamental
Durante a reunião desta quinta-feira, o presidente da CPMI, deputado Arthur Maia (União-BA) informou quer entrar com um pedido de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), assinado pelo presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), contra as decisões monocráticas do STF que permitiram a ausência de convocados pela comissão parlamentar de inquérito. A atitude vem depois da decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal André Mendonça, na semana passada, de autorizar o ex-coordenador administrativo da Ajudância de Ordens de Jair Bolsonaro, Osmar Crivelatti, a não comparecer a depoimento na CPMI. Antes dele, o ministro do STF Nunes Marques havia autorizado a delegada federal Marília Alencar, ex-diretora de Inteligência do Ministério da Justiça do governo Bolsonaro, a não comparecer ao depoimento.

— Eu procurarei tanto o presidente da Câmara, Arthur Lira, como o presidente do Congresso Nacional e do Senado, o senador Rodrigo Pacheco, no sentido de solicitar a ambos que façam uma ação direta de preceito fundamental [ADPF], para que o Supremo se manifeste se pode ou se não pode proibir a vinda de um depoente convocado por esta Comissão Parlamentar de Inquérito.

Agência Senado