Nos tempos do Iluminismo, o filósofo Voltaire (1694-1778) cunhou a frase que sintetiza o direito à liberdade de expressão: “Não concordo com o que dizes, mas defenderei até a morte o teu direito de dizê-lo”. Certamente, essa liberdade não mais conhecemos no Brasil ou, ao menos, temos um mero simulacro dela.
O recente episódio da abertura de inquérito pelo ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino, contra o deputado Marcel van Hattem por uma denúncia realizada na tribuna da Câmara dos Deputados exemplifica bem esse lamentável cenário brasileiro. O Art. 53 da Constituição Federal é cristalino: os congressistas são invioláveis civil e penalmente por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. Ora, se retirarmos a possibilidade de um parlamentar denunciar o abuso de um servidor e uma possível fraude, eliminamos por completo o sistema de freios e contrapesos do país, impossibilitando que o Congresso Nacional exerça seu papel fiscalizador.
É evidente que o deputado do Partido NOVO está cumprindo seu papel constitucional e representando os milhares de eleitores que o escolheram para alertar a população sobre os abusos de poder que vêm ocorrendo no país. Assim, é nítida a distorção das prioridades em nosso país, onde o Judiciário decide investigar um parlamentar por sua denúncia, mas não investiga a denúncia em si. O povo não pode se calar frente a um ministro da mais alta corte do país que utiliza a Polícia Federal para questionar e intimidar um parlamentar.
O fato é que vemos na Suprema Corte brasileira, de forma recorrente, uma alta dose de ativismo judicial misturada com uma conivência com a corrupção e um viés fortemente autoritário. Não é incomum ministros do Supremo Tribunal Federal expressarem suas opiniões políticas sobre temas públicos.
O ministro Barroso, em evento da UNE, enfatizou: “Nós derrotamos o bolsonarismo”; o ministro Alexandre de Moraes, por exemplo, tem sido acusado de perseguir opositores políticos. É claro para todos a interferência legislativa, a postura midiática e as relações pouco republicanas com os poderosos.
No caso específico do deputado, mais uma vez o STF demonstra a usurpação de competências e tenta colocar uma mordaça em um congressista. A tribuna é o lugar da liberdade e da expressão.
Estabelecer limites a essa garantia constitucional é tentar calar o Parlamento e sobrepor o arbítrio à expressão livre e democrática, não raras vezes por mera conveniência política.