Porto Alegre, quinta, 19 de setembro de 2024
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Artigo: Responsabilidade contra as fake news; por Marco Antônio Campos*

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Enquanto o país discute a luta contra a covid-19, um tema incendeia os debates jurídicos: as fake news. Fenômeno de vários anos e que ganha mais destaque à medida dos acontecimentos. No Congresso, um projeto de lei busca normatizar o combate às notícias falsas. No Supremo Tribunal Federal, a corte analisa neste momento a validade do inquérito que investiga suposto esquema relacionado à prática.

Juridicamente, o tema comporta muitas discussões e espalha suas raízes entre vários campos do Direito. As fake news são crime ou mero ilícito civil, ensejador de indenização? A legislação existente sobre crimes contra a honra já enquadra esse tema? Aquele que, sem intenção, compartilha uma notícia falsa também incorre numa ilegalidade?

Temos poucos juízos definitivos na doutrina e na jurisprudência, mesmo em países mais desenvolvidos. Todavia, nosso Direito já dá conta de algumas dessas questões. No campo civil, as fake news podem ser objeto de ação indenizatória — a deliberada criação de notícia falsa sobre outrem pode ser classificada como violadora da honra, da privacidade e da imagem de terceiros.

Sua tipificação no campo penal é mais complexa. Até que haja texto legal específico, somente será considerado crime se puder ser enquadrado em outro tipo penal existente, como crime eleitoral. Há, ainda, a importante discussão sobre a liberdade de expressão e de imprensa. O autor da suposta notícia falsa poderá se valer dessa proteção constitucional?

É, notadamente, um intrincado debate, que exigirá extrema responsabilidade de nossos legisladores e juristas. Quem define o que é uma fake news? Quem fiscalizará esses revisores? Que limites serão estabelecidos para que uma eventual criminalização não se transforme em instrumento de intimidação ou censura?

Não há dúvidas de que as notícias falsas exigem solução. Mas seu combate deve ser feito com equilíbrio, despido de tintas políticas e respeito à liberdade de imprensa e pensamento. Sem tais preceitos, as consequências serão imprevisíveis — sob risco de lidarmos com problemas maiores do que os de agora.

*Advogado e sócio do escritório Campos Escritórios Associados

** Artigo publicado originalmente no jornal Zero Hora