Porto Alegre, sexta, 20 de setembro de 2024
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A captura política da Procuradoria-Geral da República, por Diego Escosteguy/Vortex Media

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Marcelo Camargo/Agência Brasil

 

 

No dia cinco de maio deste ano, uma terça-feira, procuradores que atuavam nos casos da Lava Jato na Procuradoria-Geral da República voaram de Brasília a São Paulo para ouvir, em sigilo absoluto, uma das principais testemunhas da operação. O assunto era tão urgente e grave que, mesmo em meio à pandemia, pediram que a sede do Ministério Público Federal em São Paulo fosse aberta para tomar o depoimento, sem que ninguém na capital paulista soubesse sequer que eles estavam lá. Na quarta-feira, dia 6 de maio, autorizados pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, os procuradores começaram um depoimento que duraria dois dias. Foram a São Paulo ouvir o empresário Marcelo Odebrecht, protagonista de um dos maiores esquemas de corrupção já descobertos no mundo, e, hoje, talvez o delator mais temido do Brasil. Os procuradores queriam esclarecer suspeitas de corrupção contra dois ministros do Tribunal de Contas da União. Mas não só. Queriam esclarecer, sobretudo, suspeitas de corrupção envolvendo José Antônio Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal.

No meio do depoimento, a subprocuradora Lindôra Araújo, chefe formal da Lava Jato na PGR, ligou para um dos procuradores. Queria fazer perguntas à testemunha. A primeira: havia mais algum fato criminoso envolvendo Rodrigo Maia, presidente da Câmara, que não houvesse sido mencionado até então na delação da Odebrecht? Não, não havia, respondeu o empreiteiro. Naquele momento, o presidente da Câmara, responsável pela abertura ou não de um processo de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro, era visto como um “golpista” a ser “neutralizado”, nas palavras de Lindôra a subordinados e colegas.

Ato contínuo, a subprocuradora encadeou perguntas ainda mais heterodoxas. “E sobre a força-tarefa do Paraná, você viu algo estranho?”, questionou. O empreiteiro fez cara de dúvida e disse que não havia entendido. Lindôra insistiu: “Algo estranho, fora do lugar, pediram alguma coisa?”. Marcelo Odebrecht respondeu: “A senhora fala de corrupção? Não, não, nunca houve nada disso”. Apesar dessa interrupção descrita como constrangedora pelos presentes, os procuradores conseguiram questionar a testemunha. Confrontado com uma longa série de emails trocados por ele com executivos da área jurídica da Odebrecht no decorrer de anos, emails que haviam sido apreendidos pela Polícia Federal ainda em 2015, Marcelo Odebrecht confirmou o que as mensagens indicavam: Dias Toffoli, quando era Advogado-Geral da União no segundo governo Lula, entre 2007 e 2009, recebia pagamentos da Odebrecht por intermédio de um escritório de advocacia próximo ao PT.

Segundo o delator, os pagamentos destinavam-se a manter uma boa relação da Odebrecht com uma autoridade influente e em ascensão – Toffoli viria a ser indicado por Lula a uma vaga no Supremo no final de 2009. O ex-presidente do conglomerado Odebrecht disse que o então advogado-Geral da União era necessário ao grupo em três grandes “demandas” da empresa no segundo governo Lula. Afirmou desconhecer detalhes operacionais dos pagamentos descritos, assim como os valores que, segundo ele, foram repassados ao ministro. Indicou um dos diretores jurídicos do grupo, responsável pelo contato com Toffoli e pelos pagamentos narrados, como testemunha que poderia prestar mais esclarecimentos. A defesa de Marcelo Odebrecht acompanhou o depoimento em Curitiba, por meio de videoconferência. A oitiva, como se diz no jargão jurídico, foi gravada. Antes de pedir demissão coletiva das funções que ocupavam, em 26 de junho, os procuradores encaminharam à cúpula da PGR um pedido formal de abertura de inquérito perante o Supremo para investigar suspeitas de corrupção envolvendo o presidente do tribunal. Ao menos até a saída dos procuradores responsáveis, a PGR não abrira nem arquivara esse pedido.

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