O Congresso Nacional deve votar nesta semana a Medida Provisória 1.040, de 2021, com uma ideia central de desburocratização para várias atividades, principalmente, negócios. De autoria do deputado Marco Bertaiolli (PSD-SP), a proposta inclui alguns itens relacionados ao trabalho de tradução e intérprete público. Entre as mudanças, está a de que estrangeiros também possam assumir o papel de tradutores, extinguindo a seleção por concursos nas Juntas Comerciais de todo o Brasil para a certificação de tradutores juramentados.
“Se aprovada essa MP, na prática, teremos muito mais burocracia e uma enorme insegurança jurídica, porque as regras retiram a fé pública de quem faz a tradução de documentos ou qualquer outra informação, desde contratos de negócios, compra, venda, associações, até certidões de óbito, casamento, testamentos, diplomas, bulas de remédios, vacinas e uma infinidade de traduções que são necessárias nas mais diversas funções e segmentos”, explica Cláudia de Ávila Antonini, presidente da Associação dos Tradutores Juramentados do Rio Grande do Sul.
Erros e consequências – A representante observa que a tradução juramentada é um serviço público delegado e, por ter esta característica e permitir a emissão de um documento de tradução pública, permite inclusive que este receba a Apostila de Haia, chancela internacional que facilita o trânsito dos documentos brasileiros no exterior derivada de um tratado internacional com 112 países signatários, entre ele o Brasil. Os profissionais que assinam traduções são responsáveis civil e penalmente pelo conteúdo de documentos e, se mal-intencionados, e sem o devido controle como pode ocorrer com essa liberação, podem acobertar crimes, tráfico, contrabando e ações ilegais de vários tipos.
“No ano passado, por exemplo, um erro de tradução impediu que máscaras de proteção facial importadas fossem usadas na área de saúde. O texto traduziu erroneamente que as máscaras não eram adequadas para uso médico, quando, na verdade, só não podiam ser usadas em blocos cirúrgicos”, conta a representante do setor. “Sob o pretexto de incluir o Brasil em melhor situação no chamado Doing Business, uma espécie de avaliação de facilidades para o mercado, a MP vai desqualificar todo o sistema das traduções”, acredita Claudia.
Conhecimento ao Congresso Nacional – Mobilizados para evitar o impacto negativo das alterações, os tradutores juramentados apoiam uma emenda proposta pelo deputado federal Gustavo Fruet (PDT-PR). Ela tenta diminuir os riscos que a MP vai gerar, fazendo permanecer as regras de que os tradutores e intérpretes públicos devem ser brasileiros natos ou naturalizados, residentes no País, aprovados em concursos públicos e registrados nas Juntas Comerciais.
O Sindicato Nacional de Tradutores alerta, também, que a atividade dos profissionais juramentados não se trata de tradução interpretativa, onde há um aperfeiçoamento do texto, como se fosse uma edição. Em divulgação institucional, a entidade esclarece: “A tradução juramentada é um espelho do documento fonte. Se o documento fonte contém inconsistências, elas serão apontadas na tradução por meio de nota oficial explicativa. Ao tradutor público é proibido alterar, aperfeiçoar, inserir ou retirar expressões, enfim, editar o texto”. Atualmente, o Brasil possui cerca de 2.500 tradutores juramentados, sendo 300 registrados no Rio Grande do Sul.
Custos – Outro risco associado à nova MP é que ela não prevê uma tabela de emolumentos para os serviços de tradução. Atualmente, essa prestação de serviços e regulamentada em todo Brasil pelas Juntas Comerciais. No Rio Grande do Sul, por exemplo, o valor da lauda de tradução para textos comuns, como diplomas e documentos civis é de R$ 54,03. “Sem uma regulação e com preços livres de mercado, pode haver cobranças abusivas”, avisa Claudia, da associação gaúcha.