O Desembargador Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, o magistrado há mais tempo em atividade na Justiça gaúcha, se aposentou nessa segunda-feira dia 7/3, após 50 anos dedicados à magistratura.
Por último, ele atuava junto à 4ª Câmara Criminal do TJRS, a qual também presidia há cerca de 15 anos. Mas, nestas cinco décadas dedicadas ao judiciário, o Desembargador, além da jurisdição, trabalhou também na administração do Tribunal.
Trajetória
A carreira de Juiz teve início em 1971 ao ingressar na Comarca de Tapes. O Desembargador ainda atuou em Guaíba e São Borja antes de chegar a Porto Alegre.
É desse tempo, como Juiz nas Comarcas do interior, que ele traz as maiores saudades. “Foi um período muito bom da minha vida. A gente tinha o aspecto de missão nesse trabalho. Eu nunca pedi remoção e sempre me dei bem onde eu estava. Ia aos bailes da cidade, jogava futebol…”, relembra o Desembargador, que além do talento jurídico, é um reconhecido contador de histórias.
Algumas delas, ele colecionou no período em que também se dedicou à Administração do Judiciário. “Quis ir para Administração porque não pensava mais só nos meus processos, mas na eficiência da instituição. E nesse tempo fizemos projetos maravilhosos, com meus Juízes-Corregedores e Assessores”.
Além de Juiz-Corregedor, entre abril de 1985 e novembro de 1988, ele foi Corregedor-Geral por duas vezes (1998/1999 e 2004/2005). Deste tempo, ele lembra de projetos que marcaram a carreira, como o “Ouvir a Comunidade”, criado para se aproximar da sociedade: “Fazíamos audiências públicas nas Comarcas para ouvir todo mundo que tivesse interesse em fazer reclamações, dar sugestões e opinar sobre a nossa atividade. Tive o apoio de uma equipe maravilhosa e esse trabalho resultou em reconhecimento para a Corregedoria e para o nosso Tribunal”.
Esse projeto serviu de modelo de trabalho e passou a ser adotado em diversos Estados brasileiros. Uma ideia elogiada pelo Relator Especial da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, Leandro Despouy, que ressaltou a independência dos Juízes e Advogados, durante inspeção da Organização das Nações Unidas (ONU) para avaliar a Justiça brasileira. Em 2011, ele recebeu o XVIII Prêmio dos Direitos Humanos, entregue pelo Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH), em reconhecimento à atuação como Corregedor-Geral da Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.
Nessa condução de vanguarda, como Corregedor-Geral da Justiça, em 2004, ele editou provimento para que os Cartórios de Registros de Notas passassem a reconhecer uniões homoafetivas. Foi o primeiro ato oficial de reconhecimento legal das uniões entre pessoas do mesmo sexo no país, o que gerou grande repercussão internacional. “É um fato social, um fato da humanidade que tinha que ser reconhecido pelo mundo jurídico”, lembra ele.
À época, o Desembargador Aristides Pedroso de Albuquerque Neto recebeu convite do Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Corregedor Nacional de Justiça, para integrar Comissão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para regulamentar e disciplinar a carreira da magistratura.
Se na Administração o magistrado imprimiu sua marca, na jurisdição não foi diferente. Ficou por mais de 15 anos na 4ª Câmara Criminal, a qual também presidiu. Desse tempo, ele destaca o trabalho realizado em processos envolvendo Prefeitos. “Viajei por vários Estados proferindo palestras sobre o trabalho que fizemos nesta Câmara, a pioneira no país no julgamento de Prefeitos e uma referência no combate à impunidade na Administração Pública”, afirmou o Desembargador, pelo conceito de Câmara célere e eficiente.
Desde que se tornou Desembargador por merecimento, em 1994, alguns julgamentos se tornaram inesquecíveis.
Entre as memórias do magistrado, um dos processos mais difíceis e também volumosos pelos quais já teve que lidar, com 68 volumes e quase 10 mil folhas, chama atenção. Foi a ação de desapropriação do Parque da Guarita, em Torres. Ele lembra que quando viu a Kombi do malote chegar lotada com apenas um processo, pensou: “O melhor que eu posso fazer é logo enfrentar essa pilha e trabalhar”. Em um mês a ação foi julgada, sem cessar a distribuição e o exercício normal da jurisdição em 2º Grau. Nesta época, ele atuava como Juiz Substituto de Desembargador na 4ª Câmara Cível e ganhou destaque como relator em 2º Grau”.
Participou também do julgamento de apelação contra o autor de livros como “Holocausto Judeu ou Alemão?”, por prática de racismo. Este está entre um dos mais conhecidos julgamentos do Tribunal de Justiça do RS e um dos maiores do Supremo Tribunal Federal.
E assim, com feitos e fatos inesquecíveis, o Desembargador Aristides se despede, sempre fazendo questão de frisar que é um “defensor intransigente da independência do Judiciário, como do autogoverno dos Tribunais do país, em especial dos Tribunais de Justiça dos Estados, em respeito ao princípio federativo”.