Porto Alegre, terça, 26 de novembro de 2024
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Um Oscar muito interessante. De Liza Minelli ao trio de The Godfather. Do tapa de Will smith à diversidade e inclusão; por Marco Antônio Campos*

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Todo ano leio e escuto que a cerimônia na qual a Academia de Hollywood entrega os Oscars foi monótona. Acho que, por não ter distanciamento crítico, a cada ano eu gosto mais.

Essa de 2022, então, foi cheia de atrativos para um cinéfilo.

A seleção de filmes, ao contrário do que dizem os detratores, era excelente. Havia ótimos filmes para todos os gostos. O movimento de Hollywood rumo à internacionalização e à diversidade garante isto. Não caio neste papo de que todos os bons filmes já foram feitos. DRIVE MY CAR, filme japonês premiado é um trabalho maravilhoso de Ryusuke Hamaguchi.

O trio de atrizes que este foram ancoraram a cerimônia foi um achado. Amy Schumer, Vanda Sykes e Regina Hall apareceram na medida certa, fizeram piadas muito boas (ao menos para quem sabe sobre o que elas estão falando), estiveram divertidas (sobretudo na cena em que imitaram cenas de King Richard, Os Olhos de Tammy Faye e Spider Man) e ainda souberam descontrair após o incrível episódio do tapa de Will Smith em Chris Rock.

Houve vários momentos emocionantes.

A premiação de CODA, em especial a do ator coadjuvante Troy Kotsur e a de melhor filme foram muito tocantes. Eu chorei bastante. Ver a luta daquelas pessoas surdo mudas para se integrar na profissão artística é realmente a consagração de CODA. Na minha opinião CODA é um grande filme. Pouco importa que seja de pequeno orçamento e produzido de forma independente. Sua história é muito linda. Tem cenas brilhantes, como a que o pai toca a garganta da filha para “sentir” ela cantando. Acho que vai sim marcar época.

Ver Francis Ford Coppola, Robert de Niro e Al Pacino juntos no palco, marcando os 50 anos de O PODEROSO CHEFÃO foi outro momento inesquecível. O reconhecimento de Hollywood às suas lendas é sempre muito bonito. O Aplauso de pé que os três mereceram foi demais. Como não se emocionar?

Da mesma forma, achei a presença de Liza Minelli, de cadeira de rodas, ao lado de uma reconhecida Lady Gaga, outro momento sublime. Cinquenta anos atrás Liza, fulgurante subia ao palco do Oscar para receber os prêmios por CABARET.

A vida e o envelhecimento são realidades duras. Mas o reconhecimento (outro aplauso de pé de toda a plateia) é um dos mais raros e humanos sentimentos. Estava ali, frágil, limitada e doente, uma artista monstruosa, um ícone do cinema. Hollywood sabe, como ninguém, fazer estas homenagens.

Também achei excelente a fala de Kevin Costner, ao entregar o Oscar de Melhor Diretor. O ator contou que sessenta anos atrás, ali perto, viu A CONQUISTA DO OESTE, e que aquela sessão, longa e mágica, mudou sua vida. Quem já teve sua vida tocada pelo cinema, sabe da magia inigualável da tela e da sala escura. O testemunho de Costner foi memorável.

O Oscar segue aumentando sua tendência inclusiva e de consagração à diversidade. Em um mundo cheio de violência, censura e moralismos, o cinema cada vez mais funciona como um meio de ampliação do humanismo.

Por isto, o episódio do tapa ficou tão chocante e deslocado. Pouco importa que Chris Rock tenha ultrapassado o limite do bom senso na piada sobre Jada Pinket Smith. Nada justifica o gesto de violência de Will Smith. Quando recebeu seu merecido Oscar de Melhor ator, Smith estava visivelmente constrangido e balbuciou um pedido de desculpa a seus colegas e à Academia. Foi o momento infeliz da premiação. Outra cena que ficará marcada. Vai virar piada na festa do ano que vem.

De modo geral achei a premiação muito boa. Eu preferia Kristen Stewart (achei a Lady Di dela maravilhosamente interpretada) a Tammy Faye de Jessica Chastain. Mas Chastain é uma excelente atriz e está incrível no filme. Podia perfeitamente ser a escolhida.

Jane Campion ganhar o Oscar de Melhor Diretor foi outro momento histórico. Trata-se de uma cineasta excepcional. Depois de O PIANO, fez outro filme incrível, O ATAQUE DOS CÃES. Pouco importa que somente tenha ganho um prêmio: foi um dos cinco principais. Vai ficar marcado.

WEST SIDE STORY deixou sua marca. O prêmio para Arina de Bose e a presença de Rita Moreno foram uma homenagem ao personagem de Anita, um símbolo para todo latino nos Estados Unidos e para os imigrantes em todo o mundo.

DUNA ganhou todos os chamados prêmios técnicos. Fiz questão de ver o filme em uma tela IMAX gigante. É um prodígio da tecnologia. Sua fotografia, som, montagem são primorosos e se tornaram parte essencial do filme. Villeneuve vai seguir sua visão da saga de Frank Herbert. Vem mais DUNA por aí.

ENCANTO mereceu muito o Oscar de animação. Meus dois netinhos (Samuka e Caio) já viram o filme várias vezes e sabem todas as canções. Mas o fato da protagonista ser gordinha e de óculos é outro marco histórico de Hollywood.

O streaming chegou de vez ao Oscar. CODA é uma produção da Apple TV+, onde foi visto por milhões de pessoas no mundo inteiro. O ATAQUE DOS CÃES é da NETFLIX. Igualmente, ganhou platéia em todos os países em que a NETFLIX está. Mas seguramente nada se compara a ver os filmes no cinema.

Esta foi a 50ª. Cerimônia do Oscar que eu vi. A primeira foi justamente a de Cabaret, em 1972.

Espero ver muitas mais.

Hollywood sempre me encanta.

PS: Fiquei louco para ir ao Museu da Academia. Deve ser demais.

 

*Marco Antônio Campos; advogado, cinéfilo, ex-presidente do Clube de Cinema de Porto Alegre e editor do blog Cinemarco