Porto Alegre, domingo, 29 de setembro de 2024
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Lula da Silva: "Cada lado quer vencer e muitas vezes uma guerra não precisa de vencedor", por Pepa Bueno/El País

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O presidente do Brasil garante ao EL PAÍS de Madri que o acordo entre a Rússia e a Ucrânia é possível. "Por isso tento fazer a minha parte", defende. Reprodução

 

 

O Brasil voltou ao mundo e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Caetés, Pernambuco, 77 anos) encarna esse retorno disposto nada menos que a liderar a busca pela paz na guerra que sangrou a Ucrânia desde que Vladimir Putin decidiu invadir it. , com repercussão mundial. Lula fala impetuosamente, mas busca com cuidado palavras que não estraguem suas chances de mediador. Ambigüidades e equilíbrios que causaram irritação em algumas chancelarias nas últimas semanas.

Ele recebe o EL PAÍS no início de sua visita à Espanha, enquanto em seu país o ex-presidente Jair Bolsonaro depôs perante a polícia como suposto mandante do ataque golpista ocorrido uma semana após o veterano sindicalista ter assumido novamente a presidência. Lula alerta para o crescimento da extrema-direita em todo o mundo e estabelece como objetivo deste terceiro mandato a geração de emprego de qualidade e uma nova relação entre capital e trabalho. Ele me convoca para verificar, ao final de seu mandato, como terão melhorado os dados de desmatamento na Amazônia.

Perguntar:  Presidente, o senhor chega a um continente que se surpreende com uma guerra em que não se vê a luz. Por isso qualquer iniciativa que fale sobre o fim da guerra gera muita expectativa. Você lidera uma iniciativa internacional em busca da paz para a Ucrânia. Ele condenou a invasão, mas também criticou o envio de armas. A Espanha envia armas para a Ucrânia. Quando um país é invadido e a vítima pede ajuda, o que os outros países devem fazer, sentar ou ajudar a vítima?

Resposta:  A primeira coisa a entender é que esta guerra não deveria ter começado. E começou porque não havia capacidade de diálogo entre os líderes mundiais há muito tempo. O Brasil condena porque a Rússia não tem o direito de invadir o território ucraniano. Então os russos estão errados. Ou você alimenta a guerra ou tenta acabar com ela. Para mim é mais interessante falar sobre acabar com esta guerra. E ninguém fala de paz, só eu. Fui falar com Biden, com Scholz, com Xi Jinping, com Macron. É preciso se encontrar para acabar com esse conflito. E isso só pode ser feito se dois negociarem em uma mesa. É o que eu defendo.

Na Europa existe um patrimônio da humanidade, que é a União Européia. Acho que a Europa tem um papel mediador, deveria adotar uma espécie de meio termo. A Europa se envolveu muito rapidamente. Por isso é importante procurar líderes que queiram falar de paz. A China pode participar, o México, a Indonésia… Os países que ainda não estão direta ou indiretamente envolvidos e os que são solidários com a Ucrânia porque são contra a ocupação territorial da Rússia devem ser envolvidos. Devemos unir todos esses países. Na próxima semana vou falar com Macron e com outros presidentes para tentar encontrar essa paz. Já temos uma guerra contra a extrema direita no mundo, o fascismo voltou, o nazismo voltou. Não podemos ter uma guerra na Europa novamente. Será que não aprendemos com a Primeira Guerra Mundial, com a Segunda? Quanto mais paz tivermos, mais produtivo será o mundo e mais justo. Essa é a tese que continuarei a defender.

P. Como não compartilhar a busca pela paz… É óbvio que devemos tentar deter esta guerra de todas as formas possíveis, mas, enquanto isso, estamos deixando os ucranianos sozinhos sem dar-lhes apoio enquanto Putin os bombardeia?

R. Quando [o chanceler da] Alemanha visitou o Brasil, ele nos pediu para enviar mísseis de tanques comprados da Alemanha para a guerra. Eu disse a Scholz que não ia vendê-los porque se um míssil for lançado e a Rússia descobrir que o Brasil o vendeu, o Brasil entra na guerra. E quando você entra, não pode falar de paz. Quero falar com os países que não estão de forma alguma ligados à guerra para restabelecer a paz. Acredito que, se conseguirmos, estaremos prestando um bom serviço à humanidade. Porque senão a guerra não tem fim, porque Putin acredita que tem razão, e Zelenski, invadido, tem o direito de se defender. Então, quem vai acabar com a guerra? Preocupa-me que esta guerra esteja ligada a interesses políticos eleitorais. Isso já aconteceu outras vezes no mundo e não acho justo que haja uma guerra sem que ninguém construa a paz. Vou tentar fazer isso. Sei que o Brasil ainda não participa do Conselho de Segurança da ONU. Mas aqueles que ocupam esses cargos também não. A ONU tem a representação política de 1945. A geopolítica de 1945 não existe mais. A ONU deve ser adaptada para 2023.

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