Porto Alegre, terça, 01 de outubro de 2024
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RS: Servidores da FASE envolvidos em agressão a adolescente são afastados

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A Juíza de Direito Karla Aveline de Oliveira, da 3ª Vara do Juizado da Infância e Juventude do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, determinou, em caráter liminar, o afastamento de três servidores que atuam Centro de Internação Provisória Carlos Santos (CIPCS) da Fundação de Atendimento Sócio-Educativo do Estado (FASE/RS), envolvidos em episódio de agressão a um adolescente.

De acordo com a magistrada, as provas apresentadas pela Defensoria Pública do Estado (DPE/RS), por meio de depoimentos e vídeos, apontam que houve excesso do uso da força por parte dos servidores, com utilização de técnicas de estrangulamento e de objetos, como algemas, de forma inadequada, representando “evidente constrangimento, humilhação e sofrimento psicológico aos adolescentes que se encontram sob a custódia do Estado”.

A magistrada determinou ainda que a FASE apresente, no prazo de três dias, a identificação de todos os servidores que estavam trabalhando na noite em que ocorreram os fatos e que apareçam nas imagens das câmaras de segurança.

Caso

A situação teve início quando um dos agentes socioeducativos ofendeu um adolescente. O jovem reagiu “pedalando” a porta do dormitório. Para contê-lo, os agentes aplicaram golpes de estrangulamento. “Veja-se o relato de G. que presenciou K., no chão, com agentes puxando-lhe seus braços e pernas e outro sentado em cima. São estarrecedoras as imagens, as quais demonstram total despreparo do corpo técnico da unidade que, de modo abusivo e violento, recorreu à força bruta, quase um espancamento, a fim de coibir pontual desajuste. Resta asseverar que, conforme já diversas vezes exposto por essa magistrada, a equipe das unidades deve priorizar o manejo verbal, o que, à evidência, não ocorreu no presente caso”, considerou a Juíza Karla Aveline.

Conforme a magistrada, não houve o cumprimento das normas previstas no Plano de Contingência da unidade. “A atuação dos agentes socioeducadores se deu ao arrepio da lei e de acordo com ações irracionais e despreparadas, inclusive colocando em risco a vida do adolescente vítima do estrangulamento”.

“O uso da força dentro de ambiente socioeducativo deve ser utilizado de forma excepcional e apenas nos casos em que sua aplicação tenha por objetivo neutralizar ameaça com potencial depredação do patrimônio público, ferimentos ou mortes dentro das unidades. Ainda, o nível de força a ser empregado deve estar de acordo com as circunstâncias dos riscos presentes, cabendo ao agente responsável pela aplicação da lei esgotar todas as formas de diálogo possíveis antes de aplicar o uso da força em nível máximo, isto é, a contenção mecânica/manual”, pontuou.

Proteção integral

Na decisão, a magistrada discorreu sobre os mecanismos de proteção à criança e ao adolescente, a partir da ratificação e internalização de diferentes convenções internacionais, da Constituição Federal (CF) e da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente.

O ECA alterou a sistemática do antigo Código de Menores que se baseava na Doutrina da Situação irregular (Direito Tutelar do Menor), passou a reconhecer a criança e o adolescente como sujeitos de direito. “A Doutrina da Proteção Integral (art. 227 da CF e art. 3º do ECA) representou uma quebra de paradigmas ao superar antiga fase de nossa história em que o adolescente era considerado incapaz e se sujeitava à tutela estatal paternalista, por isso mesmo, abusiva e autoritária, amparada pela legislação de menores”, considerou a magistrada.

A Julgadora ressaltou ainda que, ao jovem privado de liberdade, devem ser assegurados todos os direitos que sejam compatíveis com a medida. “Sendo certo que o programa de atendimento deve se adequar para oferecer as condições necessárias à garantia dos direitos especiais e dos interesses do jovem institucionalizado, tudo em respeito ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana”, afirmou.

“Por fim, necessário, portanto, que os servidores públicos lotados nas unidades de internação (os quais exercem suas atividades laborais em frequente contato com os jovens privados de liberdade) sejam instados/direcionados, por seus gestores, ao desempenho de suas obrigações legais de forma respeitosa e digna”.