Porto Alegre, domingo, 13 de outubro de 2024
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Richard Roundtree, Guerrilheiro do asfalto; por Márcio Pinheiro*

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Em Shaft, Richard Roundtree redefiniu a masculinidade afro-americana e se transformou em um dos primeiros heróis negros de ação. Foto: Divulgação

 

 

Para ser lido ao som de Isaac Hayes em Shaft

Ele era o homem alto e altivo, que com segurança e imensa dose de arrogância atravessava as ruas de Times Square entre os carros em movimento. Era ainda uma sex machine e também o irmão-negro que arriscava o seu pescoço para defender seus brothers. Símbolo da afirmação negra do cinema blaxploitation dos anos 70, Shaft foi revolucionário ao valorizar como protagonistas atores negros em filmes policiais. Muito do sucesso do filme (que deu origem a duas sequências – O Grande Golpe de Shaft, de 1972, e Shaft na África, de 1973 – além de uma versão televisiva) se deve a Richard Roundtree, o ator que redefiniu a masculinidade afro-americana e se transformou em um dos primeiros heróis negros de ação. Roundtree morreu ontem em sua casa em Los Angeles, vítima de um câncer de pâncreas. Tinha 81 anos.

Richard Arnold Roundtree nasceu em 9 de julho de 1942, em New Rochelle, Nova York. Jogou no time de futebol americano da sua cidade-natal, fez faculdade na Southern Illinois University mas abandonou os estudos em 1963 para ser modelo, ilustrando editoriais da revista Ebony. Aluno e ator formado pela Negro Ensemble Company, em Nova York, Roundtree teve seu primeiro papel em 1967 no filme A Grande Esperança Branca, versão ficcional da vida de Jack Johnson, o primeiro campeão negro de boxe peso-pesado do início do século 20. Além de Shaft, Roundtree ainda atuou em outros filmes, sem o mesmo sucesso, mas interpretou Sam Bennett, o rabugento motorista de carruagem que cortejou Kizzie (Leslie Uggams) em Raízes (Roots), minissérie baseada no best-seller de Alex Haley.

Shaft, filme baseado na trama original do escritor Ernest Tidyman e dirigido por Gordon Parks, acompanhava o cotidiano de John Shaft, um detetive particular insatisfeito com os métodos convencionais da polícia de sua cidade e disposto a imprimir uma nova forma no combate ao crime nas ruas de Nova York.

*Márcio Pinheiro
Jornalista, escritor, editor, gestor cultural

A base de Shaft era o Harlem. Era ali que ele mantinha seu escritório – embora a maior parte da ação se passasse nas ruas, onde Shaft convivia com informantes, mendigos, bêbados.

Seus inimigos eram quase sempre traficantes, gangues de adolescentes e exploradores de prostitutas. Seu visual, com jaquetas de couro, colares, roupas escuras e um cabelo black power, ajudavam-no a circular pelo bairro como se estivesse integrado à paisagem.

O personagem se completava com um revólver com cabo de pérola que Shaft guardava na geladeira de seu apartamento duplex em Greenwich Village e com um vocabulário repleto de gírias e palavrões.

Tudo isso dava a ele um charme que parecia irresistível às mulheres – e intimidava seus inimigos.

Para alcançar seus objetivos, Shaft abusava de métodos pouco convencionais para passar a imagem de um justiceiro implacável, porém equilibrado, sem excessos. Como um guerrilheiro do asfalto, Shaft sabia que era preciso ser duro sem perder a ternura jamais.