Como as enchentes de maio impactaram os solos do Rio Grande do Sul e quais as medidas a serem tomadas daqui por diante? Este foi o tema do painel promovido pela Secretaria da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi) nesta quarta-feira (28/8), durante a 47ª Expointer, no auditório do Governo do Estado no Pavilhão Internacional.
O gerente técnico estadual da Emater/RS-Ascar, Marcelo Brandoli, apresentou alguns dados do balanço de perdas de infraestrutura e produção experimentadas pelos produtores rurais em decorrência das enchentes de maio.
“O solo mudou não só no que enxergamos, como a erosão, mas em suas composições físicas, químicas e biológicas. Mesmo assim, o produtor está plantando no solo como está, porque ele não pode parar”, destacou.
O cenário com eventos climáticos cada vez mais extremos fez a Emater/RS-Ascar criar um grupo de trabalho de calamidades de forma permanente, com abordagem multidisciplinar.
“Não há solução simples. O único jeito é trabalhar a cidade e o interior, focar nas bacias hidrográficas, adotar os princípios da conservação do solo. São problemas complexos que integram toda a paisagem do estado”, avaliou.
O gerente da Extensão Rural do Instituto Riograndense do Arroz (Irga), Luiz Fernando Siqueira, apresentou o levantamento realizado na região central do estado, uma das mais atingidas pelas enchentes, entre os produtores que cultivam arroz em terras baixas e várzeas.
“Encontramos uma quantidade significativa de cascalho e areia depositados no solo, em um volume tão grande que seriam necessários 3 milhões de caminhões para retirar. Isso vai impactar não só essa safra, mas as próximas”, alertou.
As análises do solo conduzidas não apontaram uma perda imediata de produtividade pela deposição de areia. “Mas acreditamos ser um efeito temporário. Com o passar dos dias, a tendência é de haver lixiviação dos nutrientes e empobrecimento do solo”, complementou. O Irga deve retornar em outubro para novas coletas nas mesmas áreas, para acompanhamento.
A remoção superficial de solo foi um dos principais problemas identificados na área pesquisada. “Recuperar um solo é um trabalho de 20, 30 anos. É até difícil mensurar esse tipo de prejuízo, porque formar solo de boa qualidade requer tempo e investimento”, disse.
O diretor do Departamento de Defesa Vegetal da Seapi, Ricardo Felicetti, apresentou o levantamento de dados conduzidos pela secretaria sobre o assunto. As análises espaciais da Seapi apontaram para cerca de 3,2 milhões de hectares com solos impactados, em alguma medida, pelas enchentes de maio.
“As perdas monetárias dos produtores estão estimadas em R$ 11,5 bilhões. Já para promover a recomposição do solo impactado, será necessário um recurso da ordem de R$ 6,6 bilhões”, detalhou.
Felicetti ressaltou que os diagnósticos situacionais ajudam a embasar iniciativas de recuperação da matriz agropecuária do estado. “Será preciso um trabalho coordenado de levantamento de dados, que deve envolver governos, instituições de ensino e pesquisa, e entidades do setor produtivo”, finalizou.
O professor de Física do Solo Michael Mazurana, da UFRGS, concluiu o painel destacando que a construção das soluções para problemas tão complexos passa por uma ação articulada entre diversos atores, envolvendo não só a zona rural, mas também a área urbana.
“Não há como pensar em soluções apenas da porteira para dentro. A parte externa da propriedade também precisa ser incluída na conversa: as bacias e microrregiões hidrográficas, construção de terraceamentos para manter a água na lavoura, planos para melhor uso e preservação do solo”, frisou.