Porto Alegre, domingo, 24 de novembro de 2024
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Ex-presidente do TRF-4 lança livro sobre magistratura com humor; por Renato Souza/Correio Braziliense

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Ex-presidente do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4), que julga os casos da Lava-Jato de Curitiba em segunda instância, o jurista Vladimir Passos  de Freitas, lança um livro sobre como juízes do país podem levar sua rotina com bom humor e não se deixarem atingir pelos casos que julgam no cotidiano. Na obra Vida e magistratura com bom humor, ele descreve experiências pessoais e narra parte de sua larga trajetória profissional. Ele já integrou o Ministério Público do Paraná, foi delegado da Polícia Federal, desembargador no Rio Grande do Sul e ocupou um cargo de chefia no Ministério da Justiça, no mesmo andar do gabinete do ministro Sérgio Moro.
Em entrevista ao Correio, o ex-juiz, que, atualmente, responde pela Secretaria de Assuntos Legislativos da pasta da Justiça, defende a prisão a partir de condenação em segunda instância para combater a corrupção. Para ele, o caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, recém-condenado no processo relacionado ao sítio de Atibaia, foi analisado em segundo grau por magistrados que prezam pelo caráter técnico de suas decisões, e a proporção internacional que o assunto tomou se deve ao fato de um “grande líder dos trabalhadores” estar no banco dos réus.

Como o senhor, que é consultor legislativo do Ministério da Justiça, avalia a tramitação do pacote anticrime no Congresso Nacional?
É um projeto que tem oposição, levanta discordâncias. Mas acho que está havendo bom senso. Algumas coisas passaram e já foram aprovadas até no grupo de trabalho, outras despertarão mais dúvidas, ou, por serem novas, até medo, como o plea bargain.

É um dispositivo parecido com as delações premiadas?
Não, porque é só da pessoa. O acusado faz uma negociação e diz: “olha, realmente eu pratiquei o contrabando”. Ele é preso com todo material e não tem como negar. Mas fala que gostaria de ter uma chance. O Ministério Público conversa com ele, pede que assuma o compromisso de não reincidir e reduz a pena pela metade, por exemplo. Se ele descumpre, tem o benefício suspenso.

Isso não poderia encontrar entraves na Constituição, por exemplo?
No Brasil se costuma dizer, agora, que tudo é inconstitucional, até que se prove o contrário, o que na minha opinião é um grande atraso. Para tudo o que se vai fazer de novo nesse país, no dia seguinte, tem pelo menos três pessoas dizendo que  é inconstitucional.

O projeto anticrime do ministro Moro pretende restaurar a prisão em segunda  instância. Isso não entra em choque com a decisão do Supremo?

Não. O próprio ministro Dias Toffoli, em seu voto, disse que uma nova lei ou uma reforma poderia alterar essa regra. A ministra Rosa Weber não foi tão explícita, mas também deixou claro que ela concordaria.

A prisão preventiva não resolve esse tipo de situação?
Absolutamente, não. Isso é uma falácia. Há muitas pessoas que podem recorrer sem ter a preventiva. Por exemplo, o cidadão tem uma empresa que não recolhe o INSS dos 50 empregados, o que, para eles, é um problema terrível, porque vão ser prejudicado na aposentadoria. Mas não há razão para se decretar a preventiva quando ele é condenado em segunda instância, porque ele tem casa fixa, emprego, pois é um empresário e ainda é réu primário.

O senhor acredita que a decisão da segunda instância tomada no Supremo teve influência do caso do ex-presidente Lula?
Era uma ação coletiva, não uma ação individual do presidente Lula. Se teve influência, seria dentro da cabeça de cada ministro. Eu não tenho como avaliar o que cada um pensa e como pensa.

A defesa de Lula alegou que ele não sofreu um processo justo. Acredita que ele teve um julgamento plenamente de acordo com a legislação no TRF-4?
Sim, acredito piamente. Conheço muito bem os três que julgaram. Um deles foi meu aluno na faculdade, o João Pedro Gebran, e sei da seriedade deles. Tenho certeza de que julgaram de acordo com a prova. Agora eu não me atrevo a dizer se julgaram bem ou mal. Isso eles é que sabem, até porque eles leram tudo e eu não li nada. Eu vejo pessoas fazerem críticas e até estrangeiros argumentarem sem conhecer. Eu jamais criticaria qualquer Tribunal do Brasil sem ter lido o processo.

Por que esse caso tomou essa proporção internacional e gerou essa acusação de que a justiça brasileira seria parcial?

O presidente Lula é muito conhecido no mundo inteiro. Ele é um grande líder dos trabalhadores. E um líder dos trabalhadores sempre desperta mais atenção. No íntimo, todos nós torcemos para que líderes das pessoas mais pobres cheguem ao poder e façam o bem para as pessoas.

É necessário que os juízes tenham bom humor no Brasil?
Não só os juízes, mas todos os profissionais do direito têm que levar o trabalho com bom humor, pois a atividade já é normalmente muito desgastante e cansativa. Às vezes, é muito tensa — como a de um juiz de vara de família. Então, a pessoa tem que saber equilibrar.

O juiz pega para si problemas dos outros para resolver. Como ter bom humor no meio dessa rotina?

Evidentemente, é difícil, porque, às vezes, se tratando, por exemplo, do caso de uma quadrilha, de uma facção criminosa, ou de alguém que estuprou uma criança. Nesses casos, realmente é impossível ter bom humor. Mas aí o que importa é que não se leve aquilo para outros momentos da sua vida.