Com a pandemia, sem as atividades que realizamos normalmente, parece que o tempo parou. No entanto, alguns setores, como a saúde, nunca estiveram tão atarefados: a luta diária contra o vírus tornou o trabalho extenuante. Mas é fundamental pensar no futuro (com sorte, próximo) depois da pandemia.
Na saúde – que não se desenvolve separada da economia, do trabalho e da educação -, vemos o preocupante agravamento de doenças e de novas enfermidades decorrentes da covid-19. Segundo dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO), temos cerca de 200 mil diagnósticos represados de câncer, sem falar nas inúmeras cirurgias bariátricas adiadas.
Na minha carreira como cirurgião, nunca operei tantos casos de câncer de cólon e de apendicite aguda com tempo de evolução maior que o usual. Isso acontece tanto pelo medo dos pacientes de procurarem serviços de saúde quanto pelo contingenciamento dos locais para tratamento da covid-19.
O impacto na economia afeta a todos. Muitos desses pacientes passarão a depender exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS). Os planos privados perderam 283 mil clientes até junho de 2020, conforme números da Agência Nacional de Saúde (ANS).
Teremos que enfrentar sequelas frequentes nos sobreviventes da covid-19. Pesquisas recentes apontam que a doença provoca acometimentos renais, cardíacos, hepáticos e neurológicos – estes, em cerca de 50% dos diagnosticados. E pessoas que se curaram teriam risco 59% maior de morrer dentro de seis meses após a infecção.
A imunização completa e competente da população, o investimento na saúde, a excelência na formação médica, a criação de estruturas permanentes no Interior e o foco na atenção primária e na prevenção são medidas que podem diminuir a mortalidade e acelerar a convalescença da saúde e da economia. As medidas devem ser tomadas com a participação de todos, para não tornar a pandemia uma crise alimentar, humanitária e política ainda maior.
Precisamos olhar com cuidado para o que a realidade mostra e, a partir da análise dos dados, convergir para uma situação adequada o mais rápido possível.
*Eduardo Trindade, médico e vice-presidente do Cremers
**Artigo publicado originalmente em Zero Hora