Como o senhor, que é consultor legislativo do Ministério da Justiça, avalia a tramitação do pacote anticrime no Congresso Nacional?
É um projeto que tem oposição, levanta discordâncias. Mas acho que está havendo bom senso. Algumas coisas passaram e já foram aprovadas até no grupo de trabalho, outras despertarão mais dúvidas, ou, por serem novas, até medo, como o plea bargain.
É um dispositivo parecido com as delações premiadas?
Não, porque é só da pessoa. O acusado faz uma negociação e diz: “olha, realmente eu pratiquei o contrabando”. Ele é preso com todo material e não tem como negar. Mas fala que gostaria de ter uma chance. O Ministério Público conversa com ele, pede que assuma o compromisso de não reincidir e reduz a pena pela metade, por exemplo. Se ele descumpre, tem o benefício suspenso.
Isso não poderia encontrar entraves na Constituição, por exemplo?
No Brasil se costuma dizer, agora, que tudo é inconstitucional, até que se prove o contrário, o que na minha opinião é um grande atraso. Para tudo o que se vai fazer de novo nesse país, no dia seguinte, tem pelo menos três pessoas dizendo que é inconstitucional.
O projeto anticrime do ministro Moro pretende restaurar a prisão em segunda instância. Isso não entra em choque com a decisão do Supremo?
Não. O próprio ministro Dias Toffoli, em seu voto, disse que uma nova lei ou uma reforma poderia alterar essa regra. A ministra Rosa Weber não foi tão explícita, mas também deixou claro que ela concordaria.
A prisão preventiva não resolve esse tipo de situação?
Absolutamente, não. Isso é uma falácia. Há muitas pessoas que podem recorrer sem ter a preventiva. Por exemplo, o cidadão tem uma empresa que não recolhe o INSS dos 50 empregados, o que, para eles, é um problema terrível, porque vão ser prejudicado na aposentadoria. Mas não há razão para se decretar a preventiva quando ele é condenado em segunda instância, porque ele tem casa fixa, emprego, pois é um empresário e ainda é réu primário.
O senhor acredita que a decisão da segunda instância tomada no Supremo teve influência do caso do ex-presidente Lula?
Era uma ação coletiva, não uma ação individual do presidente Lula. Se teve influência, seria dentro da cabeça de cada ministro. Eu não tenho como avaliar o que cada um pensa e como pensa.
A defesa de Lula alegou que ele não sofreu um processo justo. Acredita que ele teve um julgamento plenamente de acordo com a legislação no TRF-4?
Sim, acredito piamente. Conheço muito bem os três que julgaram. Um deles foi meu aluno na faculdade, o João Pedro Gebran, e sei da seriedade deles. Tenho certeza de que julgaram de acordo com a prova. Agora eu não me atrevo a dizer se julgaram bem ou mal. Isso eles é que sabem, até porque eles leram tudo e eu não li nada. Eu vejo pessoas fazerem críticas e até estrangeiros argumentarem sem conhecer. Eu jamais criticaria qualquer Tribunal do Brasil sem ter lido o processo.
Por que esse caso tomou essa proporção internacional e gerou essa acusação de que a justiça brasileira seria parcial?
O presidente Lula é muito conhecido no mundo inteiro. Ele é um grande líder dos trabalhadores. E um líder dos trabalhadores sempre desperta mais atenção. No íntimo, todos nós torcemos para que líderes das pessoas mais pobres cheguem ao poder e façam o bem para as pessoas.
É necessário que os juízes tenham bom humor no Brasil?
Não só os juízes, mas todos os profissionais do direito têm que levar o trabalho com bom humor, pois a atividade já é normalmente muito desgastante e cansativa. Às vezes, é muito tensa — como a de um juiz de vara de família. Então, a pessoa tem que saber equilibrar.
O juiz pega para si problemas dos outros para resolver. Como ter bom humor no meio dessa rotina?