Durante praticamente dez anos, a minha missão, em nome da minha filha, Fernanda, foi tentar construir um caminho que nos levasse a um avanço como sociedade, de forma coletiva, para tratarmos melhor uns aos outros. É preciso que a gente lide com o que houve na boate Kiss, em Santa Maria, em 2013, com mais razão do que com emoção, mas é impossível não sentir revolta. Quem deveria ter fiscalizado as instalações daquela casa não agiu com correção. Foram 242 mortes. Agora, anulam o julgamento, oito meses depois, não por erro de mérito do que foi julgado, mas por meros ritos judiciais. Eu me pergunto como se sentem os meninos e meninas que, lá em
2013, tinham 10 anos e hoje são jovens, que viram o descaso com o processo?
Como se sentem os que perderam amigos ao saber que o Estado não está nem aí para a juventude?
No julgamento, em dezembro do ano passado, foram dez dias de muito sofrimento emocional. Houve mentiras em relação ao inquérito e, infelizmente, o crime que envolve as autoridades públicas está prescrito. No momento da condenação dos quatro réus, já não tive nenhum sentimento de justiça nem de prazer. Aquilo não foi a justiça plena. Foi seletiva, porque escolheram quatro para pagar a conta e outros ficaram de fora. O que aconteceu na Kiss foi um crime horrendo. Se não fossem a negligência, o
descaso e a vaidade falando mais alto, meninos inocentes não teriam morrido. Jovens morreram por terem respirado o cianeto da queima da espuma que eles colocaram depois das reclamações por barulho e porque os extintores de incêndio estavam guardados em armários. Os acusados foram determinantes naquela tragédia.
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