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Marcos Dvoskin avalia o atual momento da comunicação no Brasil. Empresário conversou com jornalistas do Grupo COONLINE, por Felipe Vieira

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Crédito das fotos: Laura Alzueta

No mais novo encontro da Coonline, os jornalistas do grupo conversaram com Marcos Dvoskin, proprietário da Manchete Editora, empresa que surgiu da massa falida da Bloch Editores, adquirida por ele durante pregão ocorrido em 2002, quando foram leiloados os principais títulos da Bloch Editores (revistas Manchete, Pais & Filhos, Ele & Ela e Fatos & Fotos). Por 28 anos, antes de fixar residência em São Paulo, foi um dos mais influentes vice-presidentes da RBS. Na videoconferência comandada por José Antônio Vieira da Cunha, com participações de Jorge Polydoro. Márcio Pinheiro, Eugênio Bortolon, Carlos Bastos, Alexandre Bach, Elaine Lerner, José Cruz e Geraldo Hasse, ele relembrou suas experiências como executivo, analisou as novas tendências do mercado da comunicação de massa, e refletiu sobre um futuro possível para o jornalismo impresso. Também relembrou momentos importantes vividos na redação de Zero Hora, incluindo a convivência diária com personagens icônicos, como o fundador Maurício Sirotsky Sobrinho, o colunista Paulo Sant’ana e o ex-diretor de redação, Augusto Nunes.

Na RBS, Dvoskin trabalhou no almoxarifado, passou pelo setor de montagem e, mais adiante, foi o responsável pela rede montada para distribuir os jornais pelo interior. Foi um dos responsáveis pelo processo de ampliação dos impressos do grupo, como a criação do Diário Catarinense e a compra de O Pioneiro, em Caxias do Sul. Após o pedido de demissão da rede, meados dos anos 2000, recebeu o convite para conversar com executivos da Globo. Num primeiro momento, chegou a pensar que a proposta dizia respeito à emissora de tevê. Ao chegar no Rio, constatou que procuravam um profissional com perfil para o cargo de CEO da Editora Globo. O grupo editorial possuía uma área de livros e doze revistas, mais as publicações infanto-juvenis do cartunista Maurício de Souza, recém-saído da Editora Abril. A missão era o reposicionamento da revista Época, principal concorrente da Veja. Dvoskin permaneceu três anos à frente da Editora Globo.

Tanto para a RBS, quanto para a Globo, avaliou a compra dos títulos da antiga Editora Bloch. Recomendou que o processo não fosse adiante. Nos dois casos, sugeriu que aguardassem para adquirir as marcas numa possível liquidação judicial. Por casualidade, recém-saído da Globo, começava o processo de liquidação da massa falida da Bloch. Ele participou e adquiriu os títulos das revistas, optando por manter aquelas que considerou mais viáveis comercialmente (Ele & Ela, Fatos e Fatos, Manchete, Pais e Filhos e Desfile). Sob o seu comando, começou a nova fase da revista Pais e Filhos. “A Pais e Filhos vai bem. Consegue se manter financeiramente, mas sofre outro tipo de concorrência na captação de recursos, porque o ambiente digital gerou novos formadores de opinião, e uma blogueira com centenas de milhares de seguidores, também vai buscar os mesmos recursos de patrocínio nas grandes empresas como a Nestlé, antigamente disponíveis apenas aos veículos ditos tradicionais”, explicou Dvoskin. Final do ano passado, o empresário vendeu os direitos de publicação da Manchete, hoje em circulação regional, apenas no Rio de Janeiro.

Ao avaliar o desenvolvimento da comunicação, e a realidade das mídias hoje, Dvoskin refletiu sobre um caminho possível, e viável comercialmente, para o futuro do jornalismo impresso. “Conteúdo de qualidade. Empacotamento desse conteúdo, a partir de uma tecnologia. Que as pessoas possam comprar produtos em separado, ao invés de apenas o conjunto. Isso, e mais a visão comercial. Conteúdo com tecnologia, comercialização adequada por produtos. O El País e o Whashington Post, por exemplo, tiveram muito investimento e tecnologia para fazer isso. No Brasil, os impressos vivem um momento complicado”.

Segundo Marcos Dvoskin, a construção de conteúdos profundos, em contraposição ao jornalismo superficial, pressupõe tempo de produção, profissionais experientes e investimento. “A questão da distribuição da verba, das empresas que investem em mídia, também mudou radicalmente. As mídias digitais de rua, por exemplo, esses grandes painéis eletrônicos, relógios de rua, totens de propaganda em terminais aeroportuários, rodoviários, etc, ocupam hoje um espaço importante e tomam boa parte dos recursos disponíveis. É o segundo maior investimento de mídia no Brasil. A mídia externa só perde para televisão”, resume. Em 2002, recordou o empresário, os investimentos publicitários em revistas impressas somavam 11%, do total de recursos disponíveis. Hoje, não chega a 1,5 %. Segundo ele, a distribuição dos investimentos em publicidade mudou, mas o volume de recursos cresceu.

“O desafio atual do impresso massificado, acho complicado. Tem um custo, um processo, um parque gráfico envolvido. Coisas que requerem investimento, mas a receita não está vindo como antes. A credibilidade e o conteúdo são os diferenciais. Porém, está muito mais difícil, hoje, montar uma boa equipe de jornalismo, justamente por causa dessa nova distribuição dos recursos que as empresas destinam à publicidade”, avaliou o empresário. Dvoskin se declara um otimista com o futuro dos impressos, mas também um analista que trabalha com a realidade. “O desafio é muito grande”, desabafa.

Sobre o mercado da comunicação no Rio Grande do Sul, Marcos Dvoskin não se esquivou de falar, mas preferiu manter-se isento de comentários aprofundados, porque não vivencia o dia a dia da comunicação gaúcha. “Seria leviano, se fizesse qualquer avaliação. Não estou atualizado o suficiente, estou afastado e apenas ouço falar, mas eu vejo a Zero Hora trabalhando para se manter na liderança”.

Ao falar dos seus anos na empresa, relembrou a convivência com Maurício Sirotsky Sobrinho. “Com ele, aprendi tudo o que sei sobre mídia. Com as oportunidades que tive na RBS, a partir da liderança do Maurício. Postura, ética e conhecimento. Sem falar na paixão que tinha por Zero Hora. Era algo incrível. Diariamente, chegava no jornal com recortes da edição anterior e sugestões de pautas”. Segundo Dvoskin, um dos fatores preponderantes para o salto de qualidade editorial do jornal Zero Hora, nos anos 1990, foi a criação do Programa de Jornalismo Aplicado, “Houve um investimento em aprendizado, conhecimento e conteúdo. Veio gente da Espanha, Inglaterra e de todo o Brasil, para dar aulas e capacitar os profissionais”. Zero Hora chegou a circular com edição enormes, mais de 300 páginas, sendo 180 de classificados. “Não foi gratuito, que a Zero Hora assumiu a liderança dos jornais no Rio Grande do Sul. Foi muito trabalho, e levou um tempo”. Sobre o melhor desempenho de Zero Hora, no período em que esteve por lá, avaliou que houve mais de um momento. “Se olhar como negócio, rentabilidade, foram os últimos anos. Se olhar como posicionamento, foi quando assumimos a liderança no setor de jornais, antes do início dos anos 1990”.

Questionado sobre a passagem de Augusto Nunes por Zero Hora, com quem se envolveu em polêmicas na passagem do jornalista pela Revista Época, Dvoskin lembrou que o jornal já estava num processo consolidado de circulação, mas, ele foi importante naquele momento específico, que o periódico precisava avançar em conteúdo. Augusto Nunes era o homem capacitado para comandar a redação naquela fase. “Ele veio, e fez um trabalho muito importante. Houve um crescimento. Teve um salto de qualidade, em relação ao que vinha se fazendo em Zero Hora.”.

Apesar do cenário atual de dificuldades do jornalismo impresso, Dvoskin não acredita que os jornais irão terminar. Ele aposta na segmentação. “Um jornal com conteúdo qualificado, que seja referencial, e que realmente as pessoas precisem daquele veículo. Ou seja: identificar a necessidade das pessoas e apresentar um conteúdo viável como negócio, que possa pagar bem aos profissionais e seja rentável, sustentável. A busca dos recursos está muito complicada. Massificação é complicado”, avaliou o empresário. Segundo ele, a segmentação pode ser mais atrativa e viável, com performance de negócio”.

Do amigo Paulo Sant’ana, relembrou momentos e traços da personalidade. “É hour concours. Só ajudou a Zero Hora. Era um provocador absurdo, genial. E trabalhava muito. Foi um diferencial importante, muito importante. E tinha as suas manias. Numa das nossas viagens de Copa do Mundo, Espanha, houve um dia em que o Sant’ana comprou mais de dez pares de sapato. Um sujeito absurdamente espetacular, em todos os aspectos. Tinha umas tiradas sensacionais, dávamos muitas risadas com ele. E cultivava o hábito de andar pelas ruas, convivia com pessoas de todas as classes, coisa fundamental para o bom cronista de jornal. Era o rei do doce, adorava quindim e sorvete, por exemplo. E nunca foi o beberrão que todos imaginavam. Ele bebia, mas não era muito. Ele era único”. Dvoskin entende que o Paulo Sant’ana personagem, ajudou demais a empresa, em termos de audiência e referência. Também lembrou que o cronista esportivo rompeu um paradigma, numa época em que era incomum os jornalistas esportivos falarem abertamente como torcedores de seus times do coração.